sábado, julho 04, 2009

Carro eléctrico versus a gasolina: que economia em cada 100 km?

Já notei aqui como só poderá haver alguma relação entre "energias renováveis" e "independência energética" quando os carros forem eléctricos. Hoje vou partilhar convosco umas contas sobre o custo do consumo desses hipotéticos carros.
Um carro a gasolina típico num circuito combinado (auto-estrada+estrada+cidade) gasta entre 6 e 11 litos de gasolina, conforme seja um Honda Jazz ou um BMW de 6 cilindros. Admitamos, para fixar referências, que é um Honda Civic e que gasta, portanto e em média, 7 litros.
Um Civic não é concebido para a máxima economia. Uma das operações que dissipa muita energia é a travagem do "pára-arranca" urbano. Se, durante a travagem, for possível recuperar a energia cinética do carro em vez de a dissipar a aquecer os discos dos travões, muito se poupará. É isso que fazem os automóveis híbridos. Durante a travagem, em vez de aquecerem discos nas rodas, os "travões especiais" do carro híbrido funcionam como um gerador e carregam baterias. Depois, o carro usa de novo essa energia recuperada das travagens com um motor eléctrico auxiliar do a gasolina. Globalmente, portanto, é nos percusos do "pára-arranca" que um híbrido mais poupa. No percurso misto cidade+estrada+auto-estrada, um híbrido como o Insight da Honda gastará apenas 5 litros (o fabricante diz que são só 4,5l mas já isso é em condições ideais). E ainda se lhe podem acrescentar alguns aperfeiçoamentos, como a gestão do motor a gasolina no seu ponto de máximo rendimento jogando com o motor eléctrico axiliar, como faz o novo Prius da Toyota, e que reduz o consumo médio para 4,5 litros (a Toyota diz que para 3,9 l).
Ora 4,5 litros de gasolina custam hoje em dia em Portugal 6,4 € (a 1,42€/l), mas deste valor cerca de 60% são impostos para o Estado. Descontando-os, temos que num carro a gasolina optimizado para economizar (ou seja, híbrido), o custo de combustível sem Impostos será de 2,55 €/100 km. Num carro similar não-híbrido será uns 55% superior, portanto 3,96 €.
E quanta energia eléctrica gastará um carro eléctrico equivalente a um Civic? Um Tesla da Califórnia (vd. figura) diz que gasta cerca de 12.5 kWh aos 100 km, mas os números do Nissan Leaf são mais fiáveis: 24 kWh para uma autonomia média de 150 km, portanto à média de 16 kWh/100 km, um valor semelhante aos 18 kWh anunciados pelo Toyota RAV eléctrico (naturalmente, os automóveis eléctricos também fazem "travagem regenerativa de energia" como os híbridos). Ora o kwh no consumidor está no mínimo a 0,15 €, pelo que o consumo
do Nissan custará, àparte o custo da bateria, cerca de 2,4 €. Porém, este custo está presentemente subsidiado pelo défice em perto de 15% e por um IVA de apenas 5%, pelo que retirado esse subsídio e o IVA, o custo da electricidade sem impostos nem subsídos sobe para 2,59 €/100 km. E é este valor que se tem de comparar com os 2,55 € sem impostos que custarão os 100 km no carro a gasolina híbrido (ao preço actual da gasolina). Como se vê, o custo da energia do carro eléctrico nunca será inferior ao do híbrido, e se considerarmos o custo adicional a incluir no kwh das estações de carga das baterias, o custo ficará ainda maior.Claro, ficaram por tratar os custos do carro em si e o problema crítico da sua autonomia, dada a fraca capacidade das baterias existentes. Porém, o que é evidente é que qualquer comparação de custos entre gasolina e electricidade tem de ter muito cuidado em descontar a parte política dos respectivos preços; sem isso, em vez de termos os custos reais aproximadamente iguais, teremos a ilusão do carro a electricidade poder gastar 1/4 ou menos do $ que gasta o equivalente a gasolina (como nos tentam enganar aqui). Ora, não é fácil de crer que o Governo venha, num cenário futuro de carros eléctricos, a aceitar perder o Imposto sobre os combustíveis em troca de nada e muito menos em troca de um défice tarifário permanente na electricidade.Por outro lado, umas contas simples mostram que para carregar as suas baterias, se todos os carros portugueses em circulação (quiçá 3,5 a 4 milhões) forem eléctricos e fizerem de 12.500 a 15.000 km/ano, isso causará um consumo de energia eléctrica adicional de 16% do consumo nacional actual (que é de 49 Twh). Como já existe um défice de produção anual de perto de 10% (importada) e a exploração integral dos recursos eólicos nacionais dificilmente permitirá acrescentar mais que 10% ao que já está em exploração, tal significa que serão sempre precisos mais 15 a 20% de geração (além da eólica) para cobrir o consumo eléctrico automóvel e ser-se auto-suficiente em electricidade. O equivalente a uma central térmica, a gás ou a carvão, e se a quisermos descarbonizada, uma nuclear...
Actualizado em 30 de Novembro de 2011.

9 comentários:

Anónimo disse...

Esta historieta dos carros eléctricos é aglutinadora... a ela podem aderir os ecologistas da Quercus ou PEV, o Patrick Monteiro de Barros, o Mexia e, claro está, o "engenheiro". Cada qual quer assegurar o seu quinhão!

Anónimo disse...

Bem, a energia el. terá que subir muito pq o estado, a haver substituição do tipo de energia, terá que aumentar os impostos para manter os niveis de receita... por enquanto, o fuel para as centrais está isento de isp, por exemplo...
ahmaro.

Anónimo disse...

Uma análise bastante realista. Se acrecentar os custos de reforço das redes eléctricas que, em princípio terão de existir, temos a pintura quase completa... ou seja, os carros eléctricos valem o que valem... e não é, neste momento, mais que os tradicionais.

Trolha disse...

«O défice de produção anual de perto de 10% (importada) e a exploração integral dos recursos eólicos nacionais dificilmente permitirá acrescentar mais que 10%»

QUE ENORMIDADE!!!!

Podemos produzir a energia que consumimos e muito mais do que isso (este ano a importação diminuiu para mais de metade à conta das eólicas) utilizando apenas FONTES RENOVÁVEIS!!!!

As afirmações feitas são gratuitas e constituem uma enorme ENORMIDADE.

Pinto de Sá disse...

Caro Trolha nortenho,
Agradeço a oportunidade que me dá de esclarecer mais uns pontos ao post:
1 - Já temos 15% de eólica e temos que despejar de borla a energia para Espanha, nestes dias de muito vento e também muita água nas barragens. Com mais 10% de eólica, que faz 25% e que nenhuma rede do Mundo consegue gerir, acha que nossa consegue? Que sabe o Trolha de redes eléctricas?
2 - Estamos a importar menos energia sobretudo porque o consumo caiu, com a recessão. Mas que interessa não importar energia a 3ç/kWh para pagar 9 ç/kWh aos produtores eólicos, cujas turbinas foram todas importadas e financiadas com crédito externo e, portanto, défice externo?

Anónimo disse...

Entretanto o preço da gasolina em 2012 é de 1,71€/litro, tornando este post irrelevante!

Pinto de Sá disse...

Não torna irrelevante, porque entretanto o preço da electricidade está em quanto?
Acresce que o preço que interessa é sem impostos, porque se o consumo de electricidade para os carros se generalizasse, em troca da gasolina, o Governo transferiria os impostos actuais sobre a gasolina para a electricidade, ou acha que não e ficava som esse buraco no orçamento?
Mas o facto é que o seu comentário é que é irrelevante, porque entretanto se confirmou que os carros eléctricos não são comprados pelos consumidores...

João Dias disse...

O pior dos carros eléctricos é o preço das baterias. O custo dum pack de baterias dá para fazer 100.000 km num carro a gasóleo, não contanto com do preço da electricidade. Alem disso temos que considerar que para carregar os carros eléctricos as centrais eléctricas têm de poluir.

Pinto de Sá disse...

Não se esqueça que 2/3 do preço da gasolina e do gasóleo são impostos, enquanto a electricidade está com um preço abaixo do de custo graças a 1000 milhões de custos que vão para o défice tarifário... ou seja, para já parece interessante, mas a longo prazo e em massa certamente que os actuais impostos sobre a gasolina se transferirão para a electricidade, fora o tal défice...