sexta-feira, dezembro 04, 2009

Desafio à APREN e aos media que lhe fazem eco acrítico

De um leitor conhecedor destas coisas, recebi o seguinte comentário, que republico:

Já leu esta notícia do Diário Económico ?  Portugal poupa 15.300 milhões com as renováveis.

Começa assim : Os números prometem esmagar os mais cépticos.”
E termina assim :
Uma verba que daria para construir três novos aeroportos de Lisboa ou pagar, com bastante folga, a nova travessia rodo-ferroviária sobre o Tejo. As contas constam de um estudo sobre o impacto económico das renováveis, encomendado à Deloitte pela APREN - Associação de Energias Renováveis.”

Não vi o estudo, mas numa primeira impressão tenho fortes dúvidas de que as renováveis permitam poupanças daquela ordem de grandeza.
Gostava de conhecer a sua opinião.
Só o facto de renováveis como a eólica e a fotovoltaica exigirem a disponibilidade de fontes de backup põe em dúvida a ideia de que o investimento em renováveis nos permita poupar grande coisa.
O nosso PM veio há dias clamar que tal investimento nos permitia reduzir o endividamente externo. Acho isto uma fantasia. Até porque, como o Prof. tem aqui mostrado, os equipamentos são maioritariamente adquiridos no estrangeiro. Só o vento e o sol é que não, mas não sei se chega para compensar. E depois, há aqueles preços subsidiados que vão agravar o défice tarifário.
Enfim, independentemente de uma análise mais detalhada, quer o estudo, quer a notícia, cheiram muito a “encomenda”.
De facto, "Esmagar os cépticos" parece-me linguagem “soprada”. E toda esta fartura vem demasiado a calhar para os dois principais interessados. De facto, junta-se a fome (Governo) à vontade de comer (APREN).
------
De facto, vi a notícia e procurei de imediato o tal estudo na net, para conhecer a argumentação desenvolvida.
A única coisa que encontrei foi que a notícia foi cuidadosa e metodicamente "plantada" em todos os jornais e televisões relevantes, que obedientemente lhe fizeram eco.
Mas, quanto ao estudo propriamente dito, não está acessível ao público em parte alguma!
Desafio, pois (sem esperança de resposta), a APREN e/ou a Deloîtte para que coloquem o referido estudo on-line ou acessível ao Público de alguma forma.
E desafio os nossos jornalistas a que deixem de se fazer eco de notícias "plantadas" para as quais não podem ter tido nenhuma confirmação!

E já agora, a empresa que fez o estudo encomendado, é a mesma Deloîtte posta nos píncaros pela mesma COTEC que "plantou" no jornalista Nicolau Santos a "informação" de que Portugal triplicou o número de patentes registadas na Europa desde 2004, e a mesma que não encontrou nenhuma irregularidade na actuação da Administração da REN, na auditoria que lhe foi encomendada, poucos dias antes de precisamente o sr. Eng.º Penedos ter sido constituído arguido por ilegalidades nessa actuação...!

Estaremos já a viver sob o domínio da Máfia?

8 comentários:

Henrique Pereira dos Santos disse...

Ao que sei o estudo ficará disponível para a semana (penso que o desfasamento se prende com o facto da APREN ser uma associação e portanto querer dar proridade ao envio aos sócios, mas não tenho a certeza).
O facto das tarifas serem altas (e serem portanto um custo para a eocnomia) não tem nada de incompatível com a poupança de importações.
Se produzir internamente mais caro é melhor que importar mais barato é outra discussão.
henrique pereira dos santos

Anónimo disse...

Caro Professor,
Não se angustie com estas patranhas da APREN que a Deloitte capeou, valem o que valem, ou seja muito pouco, menos do que o necessário para passar num teste de Análise de Investimentos. Mas como eu os entendo… já poucos estão na disposição de continuar a pagar generosas rendas a estes senhores, e o risco de mercado é algo que eles dispensam muito bem. Felizmente, cada vez mais gente começa a entender que os sobrecustos gerados pela produção em regime especial ameaçam a sustentabilidade do sistema eléctrico nacional e a economia nacional, pelo que o actual regime não pode continuar. É contra uma lei que venha regulamentar as futuras licenças, e acabar com este regabofe que a APREN manobra, com elevados patrocínios.
Francisco

PS: Quanto aos números “esmagadores” e às contas da Deloitte aposto consigo que se desmontam em ½ folha A4.

Pinto de Sá disse...

Obrigado pela informação, Sr. Pereira dos Santos. Ficarei a aguardar com curiosidade...
Quanto ao argumento que adianta, como eu não sei nada sobre o que o relatório contém, também não sei a que crítica (antecipada) o seu argumento responde.
Em abstracto, porém, diria que a questão das importações evitadas relativamente a qualquer produto, por exemplo um combustível ou um alimento, pode ser analisada de várias perspectivas, como por exemplo:
a) se estivermos numa economia em risco de guerra, a dependência da importação para o abastecimento de produtos vitais pode ser militarmente perigosa, de facto.
b) Se a substituição da importação de produtos resultar de termos a capacidade de produzi-los nós próprios em mercado concorrencial, também é bom porque se conseguimos concorrer com as importações no nosso mercado também o conseguiremos nos mercados externos. É por isso que tem interesse desenvolver a produtividade de bens transaccionáveis.
c) Mas se para substituir a importação de certos bens (por exemplo electricidade) tivermos de importar outros (turbinas) com crédito bancário estrangeiro de que teremos de pagar (ao estrangeiro)a amortização e os juros da compra dessas turbinas (estrangeiras), então de um ponto de vista económico não estou a ver o que é que se ganhou e em que é que se diminui a dependência do estangeiro, a menos que o saldo ECONÓMICO, portanto medido em dinheiro, seja o de assim, no total, se gastar menos dinheiro e sobretudo sair menos dinheiro para o estrangeiro, a bem da balança de pagamentos e da (inexistência de) défice externo.

Henrique Pereira dos Santos disse...

"c) Mas se para substituir a importação de certos bens (por exemplo electricidade) tivermos de importar outros (turbinas) com crédito bancário estrangeiro de que teremos de pagar (ao estrangeiro)a amortização e os juros da compra dessas turbinas (estrangeiras), então de um ponto de vista económico não estou a ver o que é que se ganhou e em que é que se diminui a dependência do estangeiro, a menos que o saldo ECONÓMICO, portanto medido em dinheiro, seja o de assim, no total, se gastar menos dinheiro e sobretudo sair menos dinheiro para o estrangeiro, a bem da balança de pagamentos e da (inexistência de) défice externo."

Claro que se, como aqui faz, se confunfir a importação de bens de investimento com a importação de bens de consumo tudo fica mais difícil de explicar.
Simplesmente isso não faz o menor sentido económico.
henrique pereira dos santos

Pinto de Sá disse...

Em geral dou-me ao legítimo direito de não publicar comentários ofensivos contra mim, como o seu ("confundir", "não faz o menor sentido", etc) mas, desta vez, publiquei por achar útil mostrar a toda a gente o calibre do carácter dos defensores do tipo de argumentação do tal estudo da APREN/Deloitte.
Quanto propriamente ao conteúdo do que diz, e ignorando, portanto, os termos em que o faz (que ficam consigo):
- Ninguém falou em bens de consumo.
- O senhor pretende que eu entre na discussão de um texto que o senhor conhece mas de que não me faculta o acesso. Fica-lhe o retrato de caracter.
- Qualquer indústria requer meios de produção imobilizados e matérias-primas. Ambos são factores de produção.
- Se ambos são importados, tem-se sempre um problema de balança de pagamentos e não há diferença entre ambos, a não ser, apenas eventualmente, na temporização do pagamento.
- Suponhamos que troco o pagamento regular de uma matéria-prima importada, pelo pagamento regular da amortização e juros de um meio de produção imobilizado importado; qual a diferença, a não ser quantitativa?

A título de ilustração, há umas décadas o Brasil construiu a mega-central hidroeléctrica de Itaipu, cuja produção energética dá para cobrir duas vezes todo o consumo de electricidade de Portugal. A água da barragem não é importada, mas o investimento em si foi feito com crédito externo.
O Brasil esperava pagar a amortização e os juros do referido empréstimo com a própria produção da energia da barragem mas, devido a um crescimento do consumo inferior ao previsto, viu-se na situação de as receitas não conseguirem cobrir o serviço de dívida. O encargo era de tal ordem que o Brasil quase faliu e teve sérios problemas com o FMI para conseguir renegociar o pagamento dessa dívida externa!
O que nos vale a nós é estarmoa na moeda única!

Henrique Pereira dos Santos disse...

Caro Pinto de Sá,
É verdade que não contei com uma sensibilidade tão aguda, mas na verdade quem define o que é insultuoso é quem ouve e não quem fala.
Sendo assim, independentemente de eu não perceber de todo o que escrevi tem de insultuoso, peço-lhe desculpa pelos termos que usei.
Retomemos agora a substância:
Não conheço o estudo da APREN e da deloitte. Fiz uma coisa simples que foi pedi-lo à APREN e estou à espera que mo enviem (daí eu ter feito a referência à prioridade aos sócios que foi a explicação que me deram e estou a vendê-la pelo preço que me custou).
Vejamos, a electricidade é um bem de consumo (sim, é uma comodity, mas é um bem de consumo) para cuja produção é necessário fazer investimentos.
Para fazer o balanço global de ganhos e perdas ou se usam os tempos de vida globais dos investimentos e se compara com a produção, ou se comparam curtos períodos de produção com as amortizações correspondentes do investimento.
O que não se pode fazer é comparar o investimento total com curtos períodos de produção.
Com certeza que o facto da eólica ser um negócio de capital intensivo levanta problemas financeiros (como o que referiu para a barragem brasileira) esses devem ser tidos em atenção.
A dificuldade e a incerteza estão sempre na evolução dos preços dos combustiveis alternativos para a produção de electricidade, porque as renováveis têm custos iniciais muito elevados mas consumos mais baratos e as alternativas com sumbustiveis fósseis ou nuclear podem ter custos menores de investimento mas consomem cumbutiveis cuja disponibilidade e preço a prazo é uma incógnita.
henrique pereira dos santos

Pinto de Sá disse...

Caro Pereira dos Santos,
Postas as coisas nesses termos, já concordo consigo quanto à metodologia de análise.
É essa a metodologia que tenho usado aqui. Por exemplo no post http://a-ciencia-nao-e-neutra.blogspot.com/2009/09/nocoes-basicas-sobre-economia-da.html.
De facto, numa economia aberta e para mais com moeda única e quiçá a caminho do federalismo, não me parece fazer sentido por a tónica em balanças de pagamentos, mas sim em simples custos comparados.
A questão que coloca quanto à imprevisibilidade dos preços dos combustíveis (carvão e urânio) é real, mas o mesmo acontece quanto às taxas de juro do serviço de dívida. Em teoria. Na práticaa, não há nenhum motivo para recear grandes variações nesses factores de produção a prazo de 10 ou 20 anos e, a ahver, será mais nas taxas de juro, neste momento.

Fada do bosque disse...

E que Máfia!!! Ainda hoje ouvi o Nicolau Santos na Antena1, a dizer que Passos Coelho fez muito bem em não seguir as passadas dos seus homólogos grego e espanhol... que pediram para reduzir os juros da dívida e que fosse aumentado o prazo, para colocar o défice na meta exigida pela CE... Aos espanhóis e gregos foi concedido pela tróika, mas isso seria dar uma má imagem ao aluno bem comportado! Disse o "artista"!