quarta-feira, junho 15, 2011

Universidades: a ascensão do Formalismo e a burocratização.

Como certamente esperavam os que leram o meu post sobre "o papel da I&D no grupo EFACEC e os seus condicionamentos", chegaria a ocasião de falar das Universidades e do seu papel na I&D necessários ao desenvolvimento da economia e do bem-estar do povo que as sustentam.

Recordo que, depois do referido post (na verdade a publicação de um texto escrito na EFACEC 15 anos atrás), escrevi umas 1ªs notas de rodapé esclarecendo o que penso de dois assuntos em particular, o papel da componente curricular nos doutoramentos e a alienação na produção de papers académicos, e dias depois acrescentei umas 2ªs notas de rodapé sobre a importância dos projectos de I&D entre a Universidade e a Indústria e sobre a participação em projectos financiados por fundos europeus.
E, tendo já feito a crítica que penso necessária aos obstáculos à profícua colaboração entre as universidades e as empresas do lado das empresas, falta olhar para o outro lado.

No texto original eu já referira a Universidade e os obstáculos que lá se haviam verificado, até então, à desejada colaboração Universidades-empresas. Concretamente, referira 2 modelos de mentalidade com raízes históricas diferentes, que designara por a cultura aristocrática e o modelo americano, e depois comentara com algum detalhe o INESC. Porém, note-se, o texto de base que aqui me trouxera foi escrito há 15 anos!
Ora, se quisermos reconstituir a História da I&D nas nossas Universidades tecnológicas para situarmos a situação presente, podemos talvez caracterizar cada um de três períodos de 15 anos assim:


1965-1980: a maioria dos Professores universitários era auto-didacta e tinha o seu centro de vida nas empresas, moldando em função das necessidades percebidas nestas o que ensinava nas Universidades. A pouca Investigação que havia fazia-se em Laboratórios do Estado, como o Laboratório Nacional de Engenharia Civil, alguns Institutos médicos, a Junta de Energia Nuclear e o Laboratório Central de Sacavém da Companhia Portuguesa de Electricidade (antecessora da REN), rigidamente dirigidas numa lógica estritamente nacionalista e enquadrando os melhores engenheiros (que à época eram os melhores "crânios" que o país tinha). Uma rara excepção fora disto era a EFACEC com Renato Morgado e os seus laboratórios.
Entretanto e nessa mesma década, uma política de promoção de doutoramentos no estrangeiro, lançada nos finais dos anos 60 com a criação da JNICT (Junta Nacional de Investigação Científica e Tecnológica, antecessora da actual FCT, Fundação para a Ciência e Tecnologia), veio a produzir umas poucas dezenas de doutorados no estrangeiro que, porém, regressaram para se enquadrar disciplinadamente no quadro que havia.
Era a época dos "Senhores Engenheiros".



1980-1995: Este é o período a que essencialmente me referia no trabalho escrito para a EFACEC em 1996.
Esta época começou com a promulgação do ECDU (Estatuto da Carreira Docente Universitária) - 1ª edição, que detonou uma verdadeira revolução: as Universidades passaram a privilegiar a Investigação e a geração de doutorados no estrangeiro na década de 70 tomou o poder!
Na imediata sequência desta revolução, a multidão de antigos "assistentes" que, na tradição anterior, acumulavam o trabalho nas empresas com "dar aulas" (e fazer "folhas" de apoio às mesmas), saíram da Universidade e, em seu lugar, foi recrutada uma geração de jovens com o propósito de fazerem I&D em dedicação exclusiva.
Esta geração era de boa qualidade, até porque o novo ECDU instituíra uma carreira académica que se articulava com a obtenção de pós-graduações e criara remunerações interessantes, ao instituir um "subsídio de dedicação exclusiva" que ainda permitia remunerações adicionais provenientes de serviços prestados à sociedade (desde que no âmbito da Universidade e com nível técnico-científico “adequado à dignidade” da mesma).
Mas, sobretudo, havia uma vaga de entusiasmo e esperança no progresso do país, que parecia virar uma página decisiva na sua História e ir integrar-se na Europa desenvolvida para que estivera de costas voltadas durante seis séculos.
Como notou uma estudiosa da época, porém, estes anos assistiram a uma acesa disputa no meio académico com influência no poder político. Este texto que hyperlinkei, porém, narra a História desses tempos na perspectiva do PS, vendo nela um confronto determinado pelo que havia de vir a dominar depois, quando na verdade nesses anos o confronto era, na opinião que eu tinha em 1996 e mantenho, entre a linha aristocrática e os pró-americanos, ou talvez melhor e numa divisão nacional antiga, entre castiços e estrangeirados.
Resumidamente, de um lado havia os que se opunham à própria ideia de qualquer relacionamento com a sociedade que não fosse o ensino, que faziam Investigação como puro exercício intelectual e exigiam do Estado a correspondente subsidiação, mas também quem, esclarecido pela experiência no estrangeiro e ao mesmo tempo ainda com algum espírito do período 1965-1980, mantivesse resquícios da cultura de "Senhor Engenheiro" e combinasse autoritarismo com genuína preocupação de aplicação da nova I&D académica à sociedade.
Eram duas perspectivas diferentes, mas que tinham em comum uma visão da Universidade como terra de principados e castas (donde os "castiços"), a que chamo mentalidade aristocrática. A diferença entre elas tinha origem no tipo de assuntos a que se dedicavam os respectivos protagonistas e parece universal, como constata um estudo americano de 1996: "The faculty in applied disciplines (in this case, chemical engineering, electrical engineering, computer science, and materials science) are much more supportive of various transfer alternatives than their colleagues in the basic or social sciences".
No outro lado também se encontravam duas linhas diferentes, que tinham em comum o estrangeirismo americano. Mas enquanto uma descartava qualquer ligação à sociedade portuguesa, que desprezava, e vivia num universo mental académico virtualmente americano, a outra tinha a ambição, a iniciativa e a formação tipicamente americanas mas também um projecto de desenvolvimento de Portugal, ainda que inspirado em instituições como os laboratórios Bell. O modelo americano comum e um parco conhecimento do país real é que me leva a defini-las como estrangeirados.
Eram, portanto e na verdade, 4 mentalidades, que se arrumaram em duas alianças, como mencionei. A grande "marca" desses tempos foi o INESC, como descrevi, mas também a criação e rápida expansão de cursos de Computadores e de Engenharia Informática por todas as Universidades do país.
Depois o país aderiu à União europeia em 1985 e vieram os fundos europeus na viragem da década de 80 para a 90, e com isso o impasse do "movimento INESC": a fertilização da economia portuguesa pela I&D universitária foi sendo sacrificada àqueles fundos e a filosofia de partir das "invenções" universitárias para a economia teve parco sucesso. No entanto, no domínio das "novas tecnologias", no das empresas de software e também, em alguns casos, de electrónica, estes foram os tempos em que germinaram algumas realizações da "nova economia" portuguesa que se vieram a consolidar posteriormente.
Entretanto, a produção contínua durante 20 anos de centenas de doutorados nestas Universidades, formados num contexto de raros contratos com empresas e endogeneizados pela própria Universidade e Politécnicos, fez emergir e depois crescer uma nova mentalidade que se tornaria dominante: a dos funcionários.


1995-2010: Estes 15 anos correspondem ao prolongado Ministério de Mariano Gago e à afirmação pujante do espírito de funcionário nas Universidades, à medida que a geração que tomara o poder em 1980 se foi aposentando e sendo substituída nos lugares de decisão pela nova imensa vaga.
O funcionário, ou burocrata, tende a guiar-se pela forma das coisas, pela exterioridade das funções. Extrapolando um texto de Desidério Murcho muito conhecido dos professores do Ensino pré-universitário: "Ao longo dos anos, e sobretudo ultimamente, o papel do Ministério da Educação tem sido largamente guiado pelo único tipo de coisa que os políticos e os burocratas conhecem: a realidade virtual. Não importa se os estudantes realmente aprendem, desde que se finja que aprendem e desde que não sejam reprovados. Também não interessa se os professores realmente ensinam, desde que preencham grelhas e formulários infinitos, para dar a impressão de que estão a trabalhar. É que para a mentalidade burocrática e política, a realidade só tem densidade se estiver organizada num formulário, ....".  E para uma formalização do conceito, vale a pena recordar a definição de um filósofo do sec. XIX: "... a burocracia é o ‘Estado enquanto formalismo’; ... Como este ‘formalismo de Estado’ se constitui em poder real e se transforma em seu próprio conteúdo material, é evidente que a ‘burocracia’ é um conjunto de ilusões práticas, ou seja, é a ‘ilusão do Estado’. O espírito burocrático é um espírito totalmente jesuítico, teológico. "
Esta caracterização do "espírito burocrático" e a constatação da funcionarização dos docentes universitários afiguram-se-me cruciais para identificar a principal mudança dos últimos 15 anos na vida nas Universidades e especialmente das mais próximas do "Terreiro do Paço". E daí, portanto, a necessidade de falar da acção Ministerial em matéria de I&D para entender a posição actual das Universidades.
Ora a política do Ministério que há 15 anos rege a I&D e as Universidades em Portugal caracteriza-se, na minha opinião, por três facetas: a) a preferência pela Ciência em prejuízo da Tecnologia, vistas em oposição; b) o controleirismo estatista e o desprezo pelas empresas que não frequentam a Corte; c) o formalismo nas medidas de promoção de “transferência de tecnologia” entre as Universidades e as empresas, baseado na cópia mecânica de fórmulas estrangeiras.
As primeiras duas facetas são, na realidade, faces de uma mesma moeda que despreza a iniciativa privada produtiva e que, como noutras matérias, se reivindica de um progressismo que na realidade apenas reinventa a mentalidade do Estado centralista e cortesão, anterior à revolução tecnológica-industrial, descrente e desconfiado das iniciativas cívicas (individuais e colectivas). E, de certa forma, mais governamentalmente controleirista que o próprio regime anterior a 1974.
Já no trabalho de 1996 atrás citado se notava que, ainda em 1990, Mariano Gago se pronunciara a favor de "uma nova tendência, favorável às Universidades como os lugares, por excelência, da Investigação, e à qualidade científica (não tanto à relevância económica) como o principal critério de avaliação da Investigação", contra "a filosofia de acção até então dominante, que associava ciência, tecnologia e desenvolvimento, e via na política de Ciência basicamente um exercício de definição de prioridades".
A ideologia por detrás desta oposição do "mérito científico" à "relevância económica" é clarificada num Manifesto do Prof. Moniz Pereira, um entusiástico apoiante da ascensão de Mariano Gago, onde se afirmava em 1996: "a Ciência tem razões e valores que a Economia desconhece e desconhecerá… Por exemplo, o maravilhamento perante o conhecimento;....  Há uma diferença entre a Esquerda e a Direita na forma como se relacionam com a Ciência. A Direita, em contraposição à Esquerda, preocupa-se menos com a Ciência e mais com a Tecnologia como forma de negócio. Menos com o global e social, e os tais valores intrínsecos à Ciência, e mais com o lucro tecnológico."
Ora não é preciso conhecer profundamente o pensamento comunista para saber que também ele partilha a preocupação com a Tecnologia como factor de desenvolvimento económico (pejorativamente vistos como "negócio" e "lucro tecnológico" por Moniz Pereira); ainda numa intervenção recente no Parlamento, um deputado comunista perguntava: "...ciência e tecnologia para quê? Ciência e tecnologia ao serviço de um aparelho produtivo, para pôr Portugal a produzir — isto para o PCP." Por conseguinte, a diferença que Moniz Pereira enuncia dificilmente se poderá considerar uma clivagem entre Direita e Esquerda; é, sim, uma linha de fractura entre a mentalidade aristocrática e a industrial-tecnológica, entre os que preferem que tudo assente nos favores da corte, como vem sendo em Portugal desde quando todo o comércio nos porões das naus da Índia era do rei que depois distribuía as tenças por quem tinha que lhas ir pedir, como o próprio Luís de Camões, e os que pretendem ajudar as empresas portuguesas a competir neste mundo globalizado...!
Que a verdadeira natureza do pensamento que opõe a Ciência à tecnologia dos "negócios" e que impregna o Ministério de Mariano Gago é a aristocrática também se vê pela sua base principal de apoio na Universidade: das 4 tendências que caracterizei atrás, os seus suportes são a descendente dos antigos Professores que achavam que a única interacção legítima da Universidade com a sociedade era o ensino, e a dos estrangeirados americanos que sempre desprezaram o atraso da sociedade portuguesa. Numa recomposição das antigas alianças, onde antes se opunham castiços e estrangeirados, agora opõem-se os adeptos de uma Universidade purificada da sociedade atrasada que a rodeia e os que continuam a achar que há uma dívida para com os contribuintes que sustentam o Estado e essas Universidades - contribuintes que se organizam livremente em colaborações produtivas denominadas... empresas. E, enquanto aquelas duas tendências e o Ministério se enamoraram mutuamente, o INESC viu-se obrigado a dividir as suas actividades, separando do INESC-ID o INESC-INOV, e as iniciativas individuais de ligação às empresas ficaram sob fogo cerrado e sério risco de extermínio (moral, pelo menos)!

Há no entanto uma evolução sociológica marcante da tendência que vê qualquer actividade de ligação à sociedade além do ensino como malsã e que só valoriza a Investigação pura: originalmente marcada pelo elitismo dos "Senhores Engenheiros", os seus herdeiros são meros funcionários. E, se não praticam como os seus predecessores um autoritarismo elitista, não raro prezam o inquisitório jesuítico instrumentalizando regras, regulamentos, leis e ordens superiores sem nunca questionarem o seu sentido profundo, exactamente como o Filósofo que citei caracterizava.

Indicadores da política actual de Estado na I&D

Abordemos agora a prática concreta como o Ministério e os seus funcionários universitários aplicam a preferência dada ao "mérito científico" sobre a articulação entre I&D e economia.
Uma das primeiras medidas do Ministério de Mariano Gago foi, logo em 1996, a instituição de critérios de avaliação dos Centros de Investigação Universitários. Estes Centros, cuja concentração foi encorajada, seguindo recomendações internacionais que há muito vinham criticando a excessiva pulverização dos grupos de I&D académicos em Portugal, vivem geralmente da subsidiação governamental e que em regra era apenas suficiente para manter o metabolismo de actividades com pouca utilização de recursos laboratoriais.
Com a instituição de critérios de avaliação, os Centros passaram a ser regularmente examinados, e o seu financiamento passou a depender da classificação obtida - actualmente de 5500€ anuais a metade disso per capita doutorada, conforme a classificação vá de Excellent a Good, e nada para os centros classificados apenas com Fair ou Poor, cuja dissolução passou a ser encorajada.
Sobre estes Centros, duas questões me parecem pertinentes: como é feita a sua avaliação, e para que serviu a encorajada concentração dos mesmos?
A avaliação é feita por cientistas internacionais, contratados para o efeito pelo Estado, e seguindo critérios usuais na avaliação científica. Sendo assim, natural é que as boas classificações privilegiem as actividades mais científicas em prejuízo das mais tecnológicas, e as de Investigação mais que as de Desenvolvimento. e, com efeito, dos 378 Centros acreditados em 2007, cerca de 17% eram de Engenharia, mas destes só 12% obtiveram a classificação de Excellent, apesar da percentagem geral de Excellent ter sido de 21%. Dos 8 Centros de Engenharia que obtiveram a classificação máxima, 1 é de Braga, 3 são do Porto, 3 de Coimbra e 1 de Leiria - mas apenas um deles se pode dizer que investiga no domínio das tecnologias de informação, as que estão na base das empresas High-Tech que o movimento dos anos 80-95 lançou. Com estes critérios de classificação, o INESC desapareceu do mapa das estrelas...
Quanto à questão da concentração dos Centros, naturalmente que ela é positiva se promover a articulação dos investigadores e a dimensão e relevância dos projectos de I&D em que eles se envolvam. Mas, com critérios de avaliação baseados nos papers (por natureza individuais, dado serem a base da competição entre académicos), no número de citações dos papers e quejandos, obviamente que a única articulação promovida entre investigadores é a burocrática - passaram a ter de juntar mais contribuições individuais nos relatórios para a FCT e a terem de repartir e disputar os subsídios do Estado por mais gente, e mais nada!

De facto, aquilo que pode promover uma real concentração de esforços e combater a pulverização de actividades em I&D são projectos de I&D - grandes projectos, projectos estratégicos e financiados em correspondência, frequentemente projectos multi-disciplinares que a sectarização dos investigadores em Centros cujo propósito é a captação de subsídos estatais não promove!
Ora em primeiro lugar o Ministério subalterniza o financiamento dos projectos ao das referidas instituições burocráticas que os Centros são, como se mostra na figura anexa; em segundo lugar dispersa esse financiamento por inúmeros pequenos projectos, e finalmente selecciona-os em 90% dos casos apenas na base do seu "mérito científico", sem pré-definição de temas específicos.

Esta desproporcionada preferência pelo financiamento público aos Centros de I&D em detrimento dos projectos de I&D, e nestes a pulverização dos subsídios, sem estratégia de escolha dos temas, é precisamente uma das principais críticas feitas à actual política Governamental pelo recente Relatório da Assembleia da República sobre a Ciência em Portugal, e muito em particular por Peter Villax da Hovione e outros especialistas!
 A par desta política de financiamento público à I&D, que reflecte e promove a burocracia universitária (curiosamente, as despezas administrativas do Ministério na gestão da I&D são também motivo de nota crítica no referido relatório do Parlamento), outra faceta que tem caracterizado a política Ministerial dos últimos 15 anos tem sido a enorme proliferação de bolsas de estudo para pós-graduação.
 Antes de prosseguir gostaria de notar desde já que a história que descrevi e os problemas actuais não são exclusivamente portugueses: há grandes paralelismos com outras regiões europeias, nomeadamente espanholas, e a isso voltarei.


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A doutrina contrária ao formalismo é o realismo (do dicionário).

3 comentários:

Anónimo disse...

Caro Pinto de Sá, visto que já escreveu várias vezes sobre o tema, deixo-lhe aqui um link sobre um estudo que põe em causa a "verdura" dos carros eléctricos.

http://www.theaustralian.com.au/news/health-science/electric-cars-may-not-be-so-green-after-all-says-british-study/story-e6frg8y6-1226073103576

Desidério Murcho disse...

Muito lúcido seu texto, muito obrigado! Do meu ponto de vista, que não sei se concordará, temos um problema de fundo (não apenas no país, mas internacionalmente) que é a ideia de que é normal usar os impostos das pessoas para financiar o que elas, se pudessem escolher, não financiariam. Há algo de profundamente imoral no modo como se usa o dinheiro dos contribuintes para satisfazer os objectivos dos académicos, com a desculpa de mau pagador de que é um bem público. Público? Poderá haver casos em que bens realmente públicos precisam de financiamento do estado, porque não seriam financiados de outro modo e ficaríamos todos pior. Mas eu não consigo ver como ficaríamos todos pior se a generalidade do que se entende sofisticamente por "bem público" desaparecesse. É preciso ver que aquilo a que muita gente chama "bem público" são coisas que só as elites valorizam, pelo menos verbalmente, dando-se então a injustiça económica profunda de toda a gente financiar o que não consome nem aprecia, para que as elites, que poderiam pagar essas coisas, as tenham de graça.

Pinto de Sá disse...

Totalmente de acordo, caro Desidério!
Penso que a política pode ajudar a promover a I&D académica catalizando associações entre investigadores e interessados, sem que isso implique pôr dinheiro - das autarquias às empresas públicas, até mesmo dos Ministérios às associações empresariais. Uma política de intervenção activa que requer um muito bom conhecimento do terreno, e não distribuir dinheiro. Isto, claro, se tal for possível com honestidade e sem os habituais amiguismos e favorecimentos enviezados...
Quanto a financiamento directo, admito-o em três circunstãncias: a) como comparticipação em projectos de alto risco para os quais, precisamente por causa do risco, será difícil obter fundos particulares, e desde que tais projectos sejam considerados de potencial alto retorno; b) em casos em que é expectável a realização de sucessos de valor internacional publicitários para o país, como sucede no desporto de alta competição; c) em áreas em que seja necessário garantir a formação de futuros docentes e em que seja extraordinariamente difícil obter fundos próprios.
Daria para escrever um post inteiro, o tema...
Saudações académicas caro Desidério!