Há 14 anos, estava a desenvolver na EFACEC - Sistemas de Electrónica com alunos e um assistente que para lá levara comigo as Unidades Terminais (de SCADA) e de Protecção de Subestações (TPU, Terminal and Protection Unities), e foi-me pedido pelo Director de área que contribuísse para uma reflexão então em curso na empresa sobre as suas perspectivas de internacionalização. O que se segue é o documento interno que redigi em resposta a este pedido e que correspondia ao que pensava da política de I&D tecnológica e que hoje, mais que nunca, se encontra em oposição ao pensamento dominante - não só no Ministério de Mariano Gago, como também na minha própria Universidade, aliás alinhada com o poder (como sempre). Em 14 anos algumas coisas mudaram, mas na maioria para pior - e por isso creio ser oportuno atirar esta pedrada ao charco!
A EFACEC é o maior grupo industrial privado nacional. É também, segundo números publicados na imprensa, a entidade empresarial que maior despesa consagra à actividade de I&D (embora estes números possam estar algo empolados por uma arte bem desenvolvida e não criticável de captação de subsídios para I&D) [Nota: como vêm, não falo grátis quando falo de I&D "fiscal", mas naquele tempo os subsídios vinham essencialmente de fundos europeus, pelo PEDIP-"Medida 3" de Mira Amaral]. Mais importante ainda, a EFACEC segue persistentemente uma estratégia de internacionalização como resposta ao desafio da integração europeia, e aposta no desenvolvimento de tecnologia própria como suporte para tal. São muitíssimo raras as empresas nacionais que fazem tal aposta, a qual, com todas as dificuldades, é certamente a única que pode possibilitar um futuro ao país no 1º Mundo.
E no entanto, o grau de desenvolvimento tecnológico da EFACEC é baixo. Tal deriva de razões históricas, começando pelo facto de o próprio aparecimento da EFACEC, há cerca de 50 anos, ter ocorrido um século depois do de empresas como a SIEMENS, quando os capitais acumulados com a neutralidade do país na II Guerra Mundial e a visão do ministro eng.º Ferreira Dias o permitiram. Um século depois do nascimento das grandes empresas suas competidoras e, o que é bem mais grave, sem tecnologia própria, ao contrário daquelas!...
Depois disso, e sem deixar de reconhecer a justeza da estratégia de protecção à nossa indústria nascente, trinta anos de aversão à liberdade de mercado e, portanto, de ausência de estímulo à inovação como factor de competitividade, não permitiram mais do que iniciativas isoladas como as dos estudos experimentais em transformadores do eng.º Renato Morgado, ou a aprendizagem empírica de algumas técnicas quando das visitas à ACEC ou resultantes da análise cuidada a que os projectos licenciados sempre foram sujeitos. Esse torpor tecnológico nesses 30 anos foi, aliás, geral no país - não esqueçamos que foi apenas nos anos 70 que chegaram ao país os primeiros engenheiros doutorados no estrangeiro, onde haviam realizado Investigação, e ainda por cima a maior parte deles no sofrível sistema britânico [Nota: no Reino Unido um licenciado brilhante do IST fazia o doutoramento em 2 anos, enquanto nos EUA nunca o fazia em menos de 4; o próprio IEEE considerava o doutoramento britânico um meio termos entre as teses de mestrado e as de doutoramento americanas. Mas hoje penso que apesar disso esses doutoramentos britânicos tinham também a grande virtude de "virarem" para a sociedade concreta].
O esforço de aquisição de competências próprias na globalidade das actividades industriais da EFACEC teria sempre de ser, com tal passado, impossível, dada a pequenez do mercado nacional, mesmo se ele fosse totalmente protegido. Por isso, e por causa também das peias resultantes da dependência da ACEC, a administração da empresa apostou, e bem, na Electrónica Industrial como área nova e prioritária de desenvolvimento tecnológico, numa estratégia bem explicada por Renato Morgado em 1983. Porém, a integração europeia realizada na última década, se veio tornar ainda mais urgente a aquisição de competências próprias traduzidas em produtos capazes de competir nos mercados globalizados, veio por outro lado agravar a competição no próprio mercado nacional, reduzindo com isso os volumes de vendas e praticamente anulando as margens de comercialização e, em consequência, a disponibilidade de meios de investimento para a aquisição das referidas competências. Competências que têm duas vertentes: a tecnológica e a comercial. Mas, sendo reconhecida a extraordinária habilidade comercial da empresa, é certamente na disponibilidade de produtos de concepção própria e capazes de oferecerem vantagens competitivas no mercado internacional que reside a grande dificuldade da internacionalização - e, portanto, da própria sobrevivência.
A referida escassez de meios de investimento é entretanto compensada pela disponibilidade temporária de fundos europeus, pelo que as maiores dificuldades ao referido desenvolvimento de competências não se situarão na escassez de dinheiro. Mas, sendo esses fundos de disponibilidade temporária, é compreensível que a empresa desenvolva uma corrida contra o tempo e só endogenize na sua estrutura os Recursos que forem sendo capazes de se auto-sustentar - isto é, cuja criação de riqueza prove a sua viabilidade.
A esta encruzilhada difícil que é, em grande medida, a do próprio país, junta-se um contexto tecnológico nacional desfavorável - isto é, os parcos Recursos Humanos existentes, concentrados na Universidade e desenvolvidos aí ao longo dos anos 80, não têm uma cultura de apoio à indústria, pela qual têm, aliás, um considerável desprezo, um muito disseminado desconhecimento das capacidades existentes, e uma frequente visão das empresas como galinhas de ovos de ouro a explorar em benefício da Universidade, vista como fim em si.
Esta situação resulta de diversos factores, de que os mais importantes serão:
1) uma cultura aristocrática na Universidade, tradicional até aos anos 70, mas ainda presente em muitos doutorados sobretudo dessa década, e que se manifesta no próprio facto de terem na maioria feito doutoramentos no Reino Unido e não nos Estados Unidos da América - isto é, mais que competências, obtiveram um título nobiliárquico de prestígio. Tal espírito contrasta, por exemplo, com a atitude corrente dos asiáticos que se doutoram nos EUA, país em que, devido sobretudo à realização de cadeiras de pós-graduação tanto no mestrado como no doutoramento, estes graus têm uma qualidade muito superior à europeia. Ora é prática corrente nos EUA os asiáticos realizarem estágios em empresas americanas após os doutoramentos e antes de regressarem aos seus países - isto é, não só adquirem o “background” curricular e a capacidade de iniciativa em I&D, como treinam depois a sua aplicação no ambiente empresarial. É que o seu objectivo não é a obtenção de um título nobiliárquico para fazerem carreira nas Universidades públicas dos seus países, mas sim o de adquirirem competências úteis à actividade empresarial. No nosso país, currículos desses contam-se pelos dedos - Tribolet, Fonseca de Moura, Salcedo, etc. Claro que o ambiente nacional dos anos 70 também não favorecia uma estratégia de pós-graduações no estrangeiro visando a aquisição de competências de utilidade empresarial...! Que empresas tinha alguma vez havido, em Portugal, que produzissem baseadas em tecnologia própria, tecnologia de ponta da que se aprendia no estrangeiro e que é preciso manter em desenvolvimento? Seja como for, o certo é que tal mentalidade aristocrática que despreza a noção de produção de riqueza e procura a pura “realização intelectual”, existe. E se ela é infelizmente importante nas Universidades, nos laboratórios do Estado é mesmo um verdadeiro paradigma...
2) Outro factor crucial que, na Universidade, se opõe à criação de tecnologia de aplicação empresarial é a adopção do modelo norte-americano. Neste modelo, é a produção de I&D traduzida em “papers” que determina a valorização dos currículos e, como consequência, da progressão na carreira. Ora os “papers” só são possíveis nas áreas de conhecimento em que, em absoluto mundial, haja inovação. O modelo norte-americano pressupõe que serão depois as empresas, ou os laboratórios do Estado, quem fará o Desenvolvimento e as aplicações comerciais. Esse sistema funciona bem nos EUA, com a Universidade a fazer principalmente a Investigação de alto risco, alargando as fronteiras do conhecimento, e as empresas a fazerem o Desenvolvimento, aplicando o melhor daquele conhecimento e desenvolvendo as tecnologias rentáveis. O problema é que este modelo é bom para países em que é a indústria que detém o “know-how” aplicado, que o desenvolve e concretiza; mas nos países em que a indústria não tem esse “know-how” e precisa de redescobrir muito do que, em absoluto mundial, já é conhecido (mas não divulgado), o modelo norte-americano produz um fosso entre os interesses tecnológicos da indústria e os da Universidade. A existência deste fosso no nosso país foi bem apontada por Renato Morgado diversas vezes nos anos 80. Na prática ele traduz-se em que para um Universitário promissor, capaz de se envolver na competição por uma carreira, os temas de I&D capazes de o interessarem só podem ser os propiciadores de “papers” e não os de produtos. De “papers” aceitáveis em revistas geralmente editadas nos EUA...
Além deste fosso entre os interesses tecnológicos da Universidade e os das empresas portuguesas, gerado pelo modelo norte-americano, acontece que infelizmente o próprio modelo norte-americano tende a ser aplicado, nas Universidades portuguesas, de forma degradada. Tal degradação manifesta-se no baixo nível de muitas das cadeiras de pós-graduação ensinadas nos mestrados (cuja existência no país, é de recordar, tem pouco mais de uma década) [Nota: os mestrados de que estava aqui a falar não têm nada a ver com os actuais de Bolonha!], e na inexistência de cadeiras no doutoramento - ou seja, a faceta das pós-graduações americanas que é talvez a mais útil, a da existência de uma componente curricular de elevado nível e exigência, não está interiorizada (diria mesmo que muitas das cadeiras de mestrado das escolas de eng. portuguesas são uma fraude)! Por outro lado, o grau de exigência das Teses de Mestrado e de Doutoramento nacionais nada têm tido a ver, em anos recentes, com o das norte-americanas.
Esta degradação resulta em primeiro lugar de muitos dos docentes da pós-graduação não terem, eles próprios, realizado qualquer estudo curricular nas suas pós-graduações: ou por que as fizeram no Reino Unido ou França, onde tal prática não existe, ou por que as fizeram em Portugal antes da existência de mestrados, ou por que já as fizeram no actual sistema degradado - reproduzindo e acentuando o seu baixo nível. A invocação, por vezes exprimida, de que as licenciaturas portuguesas de 5 anos já incorporam o conteúdo das cadeiras de pós-graduação norte-americanas, esquece a tremenda diferença de nível e de exigência dessas cadeiras - resultante, antes de mais, da pré-selecção dos alunos feita, no sistema americano, pela separação do bacharelato relativamente ao mestrado, permitindo exigir neste incomparavelmente mais, e por a admissão aos doutoramentos exigir a aprovação com "A" em todas as cadeiras pré-condicionantes!...
A importação do modelo norte-americano de valores Universitários só adoptou, infelizmente e em regra, a valorização dos “papers” como medida de competitividade, não conseguindo incorporar a elevada qualidade das suas pós-graduações. Ora esta valorização tende por sua vez a sofrer da perversão dos “papers” como um fim em si, levando a técnicas de publicação por recombinação de todo o tipo de novas modas, e da perversão dessas próprias modas, nascidas muitas vezes de resultados obtidos na I&D de aplicação militar (o que é oculto mas ocupa mais de 50% da I&D universitária norte-americana), com fraca relação com os problemas industriais.
O facto é que, tal como a mentalidade aristocrática, o modelo de valores norte-americanos na Universidade é um facto incontornável. Certo é que haverá sempre indivíduos excepcionais que mesmo no ambiente descrito, ou até sem passarem pela pós-graduação universitária, conseguem obter um conhecimento aplicável de elevado valor empresarial. Mas são essencialmente auto-didactas, como tal em pequeno número, um número claramente insuficiente para as necessidades de desenvolvimento tecnológico sustentado da EFACEC.
3) Finalmente, o factor INESC. Ao contrário dos dois factores anteriores que se divorciam das estratégias de desenvolvimento tecnológico empresarial e, em particular, da do Grupo EFACEC, o INESC não recusa o Desenvolvimento de tecnologia aplicada em produtos. Porém, a forma como o faz é inconsequente e, muitas vezes, oposta ao real desenvolvimento tecnológico empresarial e à correspondente criação de riqueza.
O INESC foi criado em 1981 (na mesma altura que a EFACEC/SE...), pelo Prof. Tribolet, tendo como modelo os laboratórios Bell dos EUA. Tanto estes laboratórios da ATT em que Tribolet estagiou, como o MIT onde se doutorou, são as grandes referências da sua actuação. À época da sua criação, o INESC constituiu uma verdadeira revolução nacional no panorama tecnológico então circunscrito à Universidade e defrontou, com êxito, a oposição da cultura aristocrática dominante, aliando-se aos defensores do modelo Universitário norte-americano, liderados pelo Prof. Fonseca de Moura. A revolução consistiu essencialmente na defesa da Investigação Aplicada, na do Desenvolvimento Tecnológico, e na ligação às empresas CTT e TLP, congéneres nacionais da ATT americana numa relação replicante da que os laboratórios Bell têm com a ATT.
Em meia dúzia de anos o INESC atingiu um inegável sucesso: 1) galvanizou um largo conjunto de professores e de alunos para o seu projecto, em muitos casos por motivos generosos, particularmente entre os jovens; 2) Criou uma estrutura que rapidamente se tornou a mais eficaz no país na captação de subsídios à I&D; 3) Conseguiu criar uma imagem nacional de instituição tecnologicamente competente e disponível, vindo aliás a determinar, em grande medida, as estratégias governamentais na primeira metade dos anos 90; 4) estendeu-se a quase todas as Universidades e atingiu uma grande dimensão em quadros.
Apesar da inegável inovação que o INESC constituiu na História da engenharia nacional, ele tem geralmente falhado no seu objectivo primordial inicial: a transferência de tecnologia para o tecido económico existente. E isso resulta, sem dúvida, de uma errada filosofia que consiste em pensar a tecnologia, nascida da Investigação Universitária, no seguimento das modas e tendências norte-americanas, como o primeiro objectivo para o qual há depois que procurar aplicação económica - ou seja, em pensar a Universidade e não as empresas em mercado como o motor do desenvolvimento económico...!
Esta filosofia foi sobejamente demonstrada pela História como incapaz de criar os resultados indicados, acabando sempre, inclusive nos laboratórios Bell em que se inspirou, por gerar aparelhos pesados e improdutivos que se tornam, por força das coisas, um fim em si mesmo - acabando a competir contra as entidades económicas que pretendiam inicialmente servir, pelos Recursos Humanos, pelos subsídios, e, em certos casos, pelos próprios mercados.
Esta filosofia só é possível por que a actividade económica não é a fonte que sustenta as suas estruturas. O INESC vive à custa do Estado - através da Universidade que lhe paga os Professores e lhe cede os alunos, e dos subsídios para I&D e “formação” profissional. Os produtos resultantes da sua tecnologia não são o seu ganha-pão. E esta irrealidade acaba por ser, pelas razões oportunamente explicadas por Michael Porter, um travão à viabilização económica da I&D empresarial.
Na EFACEC e outras empresas existe, pelo contrário, a saudável noção de que o seu objectivo final são as vendas e as margens - ou seja, o dinheiro - e que a tecnologia é um meio, por vezes, de conseguir esse fim. Esta é, sem dúvida, a única perspectiva que pode fazer da tecnologia uma fonte de riqueza. A perspectiva que parte das necessidades do mercado para o Desenvolvimento de produtos, e deste para a Investigação, e não ao contrário...
Porém, uma excessiva polarização no esforço de vendas e de aumento de margens pode também fazer perder de vista a necessária cadeia de criação tecnológica. No limite, a atenção pode centrar-se de tal forma nas vendas que tenda a tornar-se uma actividade eminentemente comercial, pouco interessa de quê, e a procurar margens na redução de custos até à autofagia! Quando o mercado exige depois a disponibilidade de produtos incorporando uma tecnologia inexistente, a solução de recurso à Universidade ou INESC descobre, com frequência, a inexistência de conhecimentos e pessoas utilizáveis.
Do que foi dito resulta que é minha opinião que, numa perspectiva estratégica de longo prazo, a EFACEC deve procurar garantir o controlo da cadeia de criação tecnológica desde a sua origem, a Investigação aplicada e a formação que lhe está associada nas Universidades.
O Desenvolvimento de produtos não deve ser realizado na Universidade. A Universidade visa e deve visar a obtenção de conhecimentos e o seu ensino e, por conseguinte, deve centrar-se na Investigação associada a Teses - de licenciatura, de mestrado e de doutoramento.
O Desenvolvimento visa a criação de produtos vendáveis em mercados abertos, e portanto deve ser orientada por objectivos comerciais, ter em conta desde a concepção os custos de produção e de componentes, contemplar os aspectos de imagem, o design e as interfaces Homem-Máquina, guiar-se por preços-objectivo e pelas soluções da concorrência, e ser governada pelas regras da Propriedade Intelectual. Estes aspectos só são possíveis no interior de empresas, num ambiente empresarial fortemente integrado, nunca num ambiente de Ensino!
A EFACEC deve pugnar junto do Governo para que os subsídios que têm sido destinados ao INESC e utilizados para projectos de Desenvolvimento, sejam canalizados para as empresas, e em particular para a EFACEC. Tal transferência de fundos, que poderá ser substancial, poderá permitir à EFACEC desviar parte dos Recursos Humanos e materiais do INESC para seu próprio uso (notícias recentes parecem indicar uma reorientação positiva dos financiamentos estatais nesta direcção).
Por outro lado, a política de subsidiação da Investigação Universitária deverá ser também definida em estruturas consultivas do Estado em que a EFACEC - e eventualmente outras empresas - tenham um papel determinante. Esta é a fórmula sueca, por exemplo.
Mas, reconhecendo à Universidade o papel de efectuar a Investigação e a formação associada, e não pretendendo degradar esse papel com objectivos oportunistas de exploração de mão de obra barata, é necessário que a EFACEC possua uma noção clara das áreas em que lhe interessa estrategicamente ter “know-how”, o que por sua vez exige recursos próprios de elevado nível. Na prática, a associação a Professores universitários em áreas chave poderá ser uma solução - elementos que ajam, claro, como agentes da EFACEC na Universidade, e não o contrário.
Note-se que o oportunismo não consiste, naturalmente, em exigir trabalho gratuito a estudantes, ou em exigi-lo em quantidade. Nem tão pouco em querer que o façam para benefício de uma empresa externa à Universidade, desde que não se perca de vista que o referido trabalho gratuito é um investimento do estudante e das suas famílias visando a sua formação. O oportunismo reside em sacrificar a aquisição de conhecimentos técnico-científicos à produção de resultados comercializáveis acabados, já que não é esta a função da Escola. No entanto, a aprendizagem de matiz nitidamente profissionalizante no interior das empresas é possível e mesmo desejável - como estágios.
Há também que ter em conta que por Investigação se não entende apenas a Investigação teórica dos grandes temas, ou seja, a correspondente às Teses de doutoramento - mas sobretudo a Investigação aplicada de certos assuntos ou problemas bem definidos e mais ou menos complexos, que podem ir desde o estudo das potencialidades de um novo microcontrolador para alguma aplicação específica, à implementação de um algoritmo de estimação de estado num certo ambiente de software. Investigações, por outras palavras, adequadas a Teses de Licenciatura (sem tradição no nosso país mas equivalentes a Trabalhos Finais de Curso) ou de Mestrado - dado que toda a Investigação Universitária tem ser capaz de se traduzir numa formação académica bem identificada ou é oportunista. Desde que estas condições sejam verificadas, só se pode desejar que toda a actividade de Investigação seja do interesse das empresas e suscitada por elas, não faltando na EFACEC os temas que a motivem.
Entretanto, é de sublinhar a importância que tiveram dois projectos de I&D desenvolvidos sob contrato entre a Indústria e a Universidade, para a formação de dois engenheiros que aliam, nas suas competências, a formação tradicional em Sistemas de Energia com o domínio de novas tecnologias informáticas, e que são dos raros, no país, a possuir as aptidões de que a EFACEC necessita. Não há qualquer dúvida de que resultaram do facto de os seus trabalhos de Investigação terem sido orientados por necessidades industriais (embora da EDP, em ambos os casos).
Para que esta subordinação da Universidade seja possível, é necessário desenvolver uma estratégia de relacionamento institucional com a Universidade. O limite desejável será gerir uma Universidade em parceria com outras empresas e determinados organismos do Estado, como é bom exemplo o SUPÉLEC, sem dúvida a Universidade francesa que maior prestígio tem conseguido nos últimos anos, e cujos “papers” são do melhor que se tem publicado recentemente no estudo de problemas bem reais, usando com alto nível novas ferramentas mas bem adequadas a esses problemas...
Tal limite será difícil no nosso pequeno país, a curto prazo. A alternativa poderá ser, então, uma estratégia de aliança a grupos de Professores visando a tomada do poder interno de alguma(s) Universidade(s) existente(s), estratégia do tipo da que o INESC desenvolve como grupo na Universidade, o que requer meios de pressão e de atracção - provavelmente o poder de, através do Estado, definir as políticas de subsidiação da Investigação Universitária.
Muito do que aqui exprimia em Janeiro de 1997 ficou desactualizado com a adopção de Bolonha, na última década. E, por outro lado, no que respeita especificamente à EFACEC, pode-se dizer que ela prosseguiu esta visão mas muito moderadamente e circuncrevendo-se à FEUP, onde o INESC-Porto conseguiu escapar à voragem estatista e pior que aristocrática, cortesã (numa tradição nossa milenar que não enfraquece), que os Governos do PS trouxeram consigo como modelo à I&D tecnológica. Conseguiu até passar a ter enorme influência sobre o Governo dos "mouros", enquanto preservava a sua estratégia própria.
Pena é que reine ali um regionalismo radical e auto-exclusivo da nação no seu todo.
3 comentários:
A EFACEC além desses problemas identificados de forma brilhante neste "post" ainda tem outro:
Demonstra muita dificuldade em manter um quadro estável de engenheiros em funções técnicas. Há muita tendência a remunerar trabalhos técnicos especializados (no qual incluo a I&D) da mesma forma que trabalhos não especializados. Essa estratégia tem consequências.
Em abono da verdade também se diga que não é a única empresa em Portugal com esta atitude.
"A invocação, por vezes exprimida, de que as licenciaturas portuguesas de 5 anos já incorporam o conteúdo das cadeiras de pós-graduação norte-americanas, esquece a tremenda diferença de nível e de exigência dessas cadeiras - resultante, antes de mais, da pré-selecção dos alunos feita, no sistema americano, pela separação do bacharelato relativamente ao mestrado, permitindo exigir neste incomparavelmente mais, e por a admissão aos doutoramentos exigir a aprovação com "A" em todas as cadeiras pré-condicionantes!..."
Isto e falso e aposto que nem consegue dar um exemplo dessa exigencia de aprovacao com A nas cadeiras pre-condicionantes em universidades de topo, digamos Ivy League por exemplo.
Tenderia a não lhe publicar o comentário, dada a acusação de falsidade ao que afirmei, mas aproveito para dizer que pode consultar na net os programas de doutoramento e verificará que em regra se exige um nível de classificação nas disciplinas de "PhD encouragement".
Quanto a exemplos, embora não goste de particularizar, posso dar um (anterior a esta reflexão que redigi em 1997): o do Ph.D em Power Systems no Georgia Technology Institute em que um colega meu se doutorou (no final dos anos 80).
Mas leia isto, para começar:
http://en.wikipedia.org/wiki/Doctor_of_Philosophy#United_States
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