quinta-feira, julho 15, 2010

A batalha pela próxima política energética nacional

A há muito descredibilizada agência nacional informativa LUSA, divulgou sexta-feira que "A utilização da energia nuclear dividiu esta sexta-feira os especialistas ouvidos pelo líder social-democrata Pedro Passos Coelho".
E, como que a confirmar a LUSA, à saída dessa reunião de esclarecimento, o Eng.º Carlos Pimenta terá afirmado aos jornalistas que "o nuclear não cabe em Portugal".
Ora se há coisa que nessa reunião nem sequer foi aflorada, foi o nuclear!
Mais perto da verdade mas em sentido contrário ao da LUSA, o Expresso anunciou a reunião de trabalho como visando discutir as "energias renováveis", e o Eng.º Moreira da Silva, o jovem vice-Presidente do PSD actualmente com o pelouro dessas questões naquele Partido, explicou quais as preocupações que realmente haviam motivado a reunião: a inovação, a regulação, a concorrência, a política de inovação e a fiscalidade.
O Público desta vez também foi exacto, na informação que deu - a jornalista Lurdes Ferreira deve ter ido de férias... :-) - e noticiou que Moreira da Silva considera a aposta na eficiência energética a melhor estratégia nacional, para já.

Na verdade, verificou-se um embate da batalha política pela estratégia energética nacional que opõe os ecotópicos e os seus lobbies de sustento aos portugueses honrados (reutilizando uma velha etiqueta que em tempos usavam os oposicionistas).
Todos concordam com a necessidade de reduzir a dependência do petróleo e as emissões de CO2. Nisso, há um consenso que abarca toda a gente no país.
Onde se situa a divisão é entre os que defendem a consideração de todas as opções tecnológicas (full portfolio) de modo a minimizar o custo das soluções para o povo e a Humanidade, e os que são movidos por preconceitos ideológicos fundamentalistas, só aceitam certas energias renováveis (limited portfolio) e não lhes interessam nem os custos, nem a verdade, nem as pessoas reais.

Nos EUA, onde o debate e a independência de opinião são muito mais ricos que na Europa, esta divisão foi detectada há muito, razão do estudo que o EPRI, a super-estrutura de I&D energética americana, fez em 2007 e actualizou em 2009, pondo em confronto as consequências económicas dessas duas vias e que eu já invoquei aqui e aqui.
Muito recentemente foi publicado um outro estudo, nos finais de 2009, por uma instituição com ainda mais gabarito que o EPRI, a Academia Nacional de Ciências dos EUA, e que aponta para as mesmas conclusões! Pode ser lido gratuitamente on-line aqui, e o seu sumário pode ser descarregado aqui.
O estudo da Academia das Ciências dos EUA (NSA) considera a melhoria da eficiência energética a aposta com resultados mais rápidos e garantidos nos EUA, nos transportes, indústria e sobretudo nos edifícios. Mas, a um horizonte de 10-25 anos, recomenda as apostas nas energias renováveis, no carvão limpo (captura e sequestro do CO2), na energia nuclear e em combustíveis alternativos para os transportes.

Em futuros posts hei-de discutir convosco detalhes do extenso relatório da NSA, mas hoje queria só dizer-vos que esta oposição de ideias em Portugal não parece ser conciliável, dado o fundamentalismo sectário e arrogante dos ecotópicos. Uma conversa que tive com um colega da FEUP num intervalo da referida reunião com Passos Coelho esclarece tudo.
Esse colega abordou-me, comiserado com o que ele e o seu grupo julgam ser o meu reaccionarismo e falta de visão de futuro, e disse-me: "imagina que há 20 anos também tinhas dito a alguém que as protecções digitais não teriam futuro; já viste o erro que terias cometido? Agora estás a fazer o mesmo!".
Acontece que esta história aconteceu realmente, mas ao contrário! Há 20 anos, precisamente, a antecessora da REN encomendou-me um estudo sobre "o estado da arte das tecnologias numéricas em Subestações", como apoio a um projecto que então iniciavam com a indústria nacional, indicando-me pretenderem que eu elucidasse o papel que a Inteligência Artificial iria ter na automatização de Subestações. Pois o resumo do meu estudo foi que a Inteligência Artificial não iria ter papel nenhum, mas que as protecções digitais é que sim! A antecessora da REN não gostou das minhas conclusões, mas foi isso mesmo que aconteceu e o projecto deles com a indústria nacional ficou em águas de bacalhau. Foi essa indústria que depois me envolveu no desenvolvimento das protecções digitais nacionais, projecto que lá realizei na década seguinte.
No caso das "micro-redes" e do fundamentalismo eólico-solar a minha recusa não é tecnológica, mas política, pelas razões que este blog tem vindo a testemunhar!

Tentando contemporizar, disse ao meu colega da FEUP que, embora não acreditasse no futuro das "micro-redes" e "smart grids" associadas em que ele anda envolvido, do ponto de vista de I&D considerava que havia no assunto tecnologias interessantes e que concordava em que se investisse no seu conhecimento, acautelando o futuro. Mas que, pelas mesmas razões de cautela com o futuro, achava que se devia investir também no conhecimento das tecnologias da energia nuclear...
Ora quando falei na energia nuclear o semblante do meu interlocutor crispou-se numa recusa completa. E notem, eu estava só a falar em investir em conhecimento!!!...
Penso que isto resume a natureza deste confronto.

3 comentários:

Anónimo disse...

A investigação nas «redes inteligentes» devia resultar num «produto» que permitisse que cada consumidor consumisse unicamente electricidade proveniente das fontes que ele aprovasse.
Evidentemente que nenhuma fonte deveria ter subsídios…
JM

Anónimo disse...

Está visto que em Portugal o conhecimento das matérias não interessa.

É preciso é coisas para investigar e tirar uns €€ da União Europeia, governo português, ou de alguma empresa que queira/tenha de seguir a moda do momento.

Se não há conhecimento como podemos tomar decisões acertadas?

Choca-me imenso que um professor universitário da FEUP não contemple sequer a hipótese de aumentar conhecimento numa determinada área. Não deveria ser o papel da universidade ser conservadora e autista ao resto do mundo.

Anónimo disse...

A eficiência energética é sempre desejável porque implica a inexistência de desperdícios.

No entanto não substitui uma política energética já que os desperdícios de energia até nem serão a maior parte do consumo.

Espero que o maior partido da oposição não relativize a necessidade urgente de um plano energético (de preferência fundamentado para não se cair em disparates semelhantes aos das eólicas) para Portugal. Gostaria de um plano que não onere os consumidores com custos resultantes de subsídios para os "amigos".