domingo, março 04, 2012

Ainda sobre o morrer de frio em Portugal

Vários leitores deste blog me manifestaram o seu cepticismo quanto à atribuição do anormal excesso de mortes recentes ao custo da energia em Portugal que eu responsabilizei pelo funesto facto, recentemente e também há dois anos.
As dúvidas que me foram levantadas são de dois tipos: um é sobre a validade dos dados (estatísticas de mortalidade), e o outro é sobre as eventuais causas do facto, admitindo-o como verdadeiro.
Quanto à verdade dos factos, o excesso de mortalidade associado aos picos de frio em Portugal, existe um estudo de fundo de que o Diário de Notícias dá hoje conta: Portugal é efectivamente o país europeu onde mais de morre de frio, com um excesso sazonal de 28% relativamente à média europeia! É, aliás, facto sobejamente conhecido do senso comum minimamente viajado, o de que em Portugal se passa muito frio, mesmo comparando com países de Invernos muito mais rigorosos, e por isso nem vale a pena perder mais tempo discutindo isso.
Quanto à causa dos factos, porém, já o assunto é mais discutível.
A maioria dos media, hoje em dia mais que nunca dependentes da publicidade para subsistirem e, por via disso, das empresas que mais publicitam como a EDP (para já não mencionar a promiscuidade entre os assessores de imprensa desta empresa e os media onde foram recrutados...), argumentam que a causa principal é a falta de isolamento térmico das habitações e causas vagas como "a crise", "a pobreza", ou específicas como o custo dos medicamentos. Além da dependência económica que referi (da publicidade da EDP), a ideologia nacional-ecologista alemã (pró-Enercon) que impregna muita da nossa intelectualidade, mesmo a de direita, ajudam a explicar porque da carestia da energia nunca falam!
De resto, não sendo este problema novo, é interessante constatar que existem em Portugal estudos sobre o efeito das vagas de calor na mortalidade, mas sobre as de frio não - ou por outra, existe menção a um estudo encomendado há anos, mas de cujos resultados não há notícias...
No entanto, Portugal tem participado numa investigação da OMS sobre "habitação e saúde", um estudo mais orientado para se preocupar com as emissões de CO2 caseiras na saúde que com o frio, mas de onde resulta a constatação de que metade dos idosos portugueses não tem meios para manter as casas quentes.
Vai daí, os ecotópicos ao serviço do nacional-ecologismo alemão têm vindo a defender que o mal está na má qualidade térmica das casas, esquecendo propositadamente que a melhoria do isolamento térmico das habitações é uma coisa cara, e que é precisamente por isso que ela não existe por cá!
Melhorar o isolamento térmico das habitações é uma rúbrica integrada no tema da moda da "eficiência energética" (também ele ditado pelo nacional-ecologismo alemão que manda em Bruxelas). Requer elevados investimentos de retorno económico a longo prazo, e por isso vale a pena notar que acaba de sair um relatório de Bruxelas sobre esse tema, donde extraio o seguinte que todos os que atiram para canto com este tema deviam saber:

"It is a well-established fact that energy efficiency does not happen to the extent that “the rational economist” would predict due to well-known market barriers. These include:

An emphasis on reducing capital expenditure rather than life cycle costs

The landlord tenant or split incentives where the investment in energy efficiency by the owner materialises to the tenant of the building

Energy efficiency is rarely a single measure or activity and as such, particularly for households, can represent hassle or inconvenience (transaction costs) in trying to arrange a variety of different skilled technicians, etc.; this is often linked to concerns about the quality of workmanship from small (unknown) companies

...

For small businesses and households, the lack of personalised advice and knowledge of what exactly needs to be done in their premises or property is significant; this is often linked to uncertainty about whether the claimed energy savings will be attained

Perceived risk of energy efficiency investments by financial institutions

Owner occupiers in the residential sector do not always have the cash available to meet the costs of those energy efficiency measures (particularly some of the more expensive wall insulation solutions) and are not convinced that at commercial interest rates, they will stay in the property long enough to benefit from the ongoing savings; this is an issue because apart from double glazing, there is little evidence that most energy efficiency investments add a significant value to the property

Policy inconsistency and lack of long term commitment to energy efficiency initiatives by governments"

Sublinho a nota de que os pobres que não têm dinheiro para a electricidade, também não o têm para mandar isolar termicamente as casas!

E, se quando se vive na aldeia sempre há a solução da lenha e das lareiras e salamandras, nos subúrbios das grandes cidades onde agora vive a grande maioria da população, sobretudo nas casas mais antigas onde vivem os idosos, o único recurso é mesmo o aquecimento eléctrico ou a botija de gás - qual deles o mais caro!...
Pelo que volto à minha posição: a culpa destas mortes é da concreta e especifica carestia da electricidade resultante das políticas energéticas adoptadas desde o Governo de Guterres!