domingo, outubro 30, 2011

Smartgrids: Fantasia e realidade. Parte IV: os roteiros de Portugal

Há cerca de um ano iniciei uma série de posts sobre as smartgrids, começando por uma apreciação do roteiro europeu.
Dias depois acrescentei uma apreciação do roteiro norte-americano, e a seguir do roteiro da China, onde concluía com um sublinhado da importância de normas internacionais, standards, de comunicação informática para a viabilização das smartgrids em larga escala.
Neste último post anunciava que terminaria a série com um post final sobre as perspectivas portuguesas, mas passaria um ano até que as condições para isso estivessem maduras, coisa que considero estar neste momento. No último número (3º) da revista Energia e Futuro publiquei um artigo de síntese sobre o assunto, de que respigo aqui as conclusões:
7.    Lições do périplo e opções para o roteiro português nas smartgrids
Portugal, como já foi referido, adoptou na década transacta a visão europeia mais utópica  das smartgrids, com um firme apoio do Governo e das empresas de electricidade em que este detinha golden-shares. Exemplos da promoção governamental desta visão foram o projecto “Green Islands” para os Açores, e na EDP uma experiência de instalação de smart meters foi reali­zada na cidade de Évora, embora ainda não sejam conhecidos resultados práticos da mesma. No entanto, o périplo que aqui se fez pelos diversos roteiros para as smartgrids nos grandes blocos mundiais permite suportar as seguintes lições:
I.     O objectivo principal da instalação de smart meters, como componente das smartgrids, é o suporte de tarifas de electricidade volá­teis e rapidamente variáveis que reflictam a disponibi­li­dade intermitente da energia gerada por fontes eólicas e solares, supostas dominantes ou mesmo exclusivas no mix elec­tro-produtor; um objectivo secundário mas importante nos EUA é uma racionalização dos consumos e correspondente redução. Um outro propósito pode exis­tir, o da redução de “per­das comerciais” (fraudes e furtos) quando estas são signifi­cativas [1], moti­va­ção princi­pal da Itália quando iniciou a instalação de smart meters em larga escala em 2006; mas este propósito pouco tem a ver com smart­grids.
II.     A operacionalização dos smart meters acarreta sempre, no actual estado da tecnologia, um subs­tancial agravamento de custos [2], agravado pelo contexto de uma geração predominante intermitente que arrasta uma subida generalizada das tarifas. Este aumento de custos sus­cita reacções negativas dos consumidores que são dificil­mente suportáveis pelos operadores em ambientes democráticos, e os estudos realizados na Europa sobre a rentabilidade do investi­mento em smart meters têm sido todos negativos (excepto quando as “perdas comerciais” evi­tadas são importantes).
III.     As experiências americanas mostram que a racionalização de consumos e alguma adaptação dos mesmos à intermitência da geração (reflectida nas tarifas) só é aceite por parte conside­rá­vel dos consumidores se: 1) lhes proporcionar ganhos económicos; 2) não causar descon­forto excessivo; 3) garantir a privacidade e permitir dizer “não”; 4) exigir uma intervenção mínima, intuitiva e livre (do tipo “carregar num botão”). Estes requisitos só podem ser satisfeitos por sistemas intei­ramente automáticos que liguem em rede aparelhos consumidores e electrodomésticos aos smart meters, sistemas esses de baixo custo. Este baixo custo requer, por sua vez, a existên­cia de normas de comu­nica­ção para essas redes domésticas que permita a interoperabilidade de novos apa­relhos consumidores fabricáveis em massa, garantindo, assim, a concorrência e a ino­vação. Estas normas ainda não existem e, sem elas, não haverá fabri­cação dos referidos apare­lhos “smart” e, sem estes, não haverá “gestão da pro­cura” em escala significativa.
IV.     Dos pontos anteriores conclui-se que a “gestão da procura” numa escala económica e sistemi­camente significativa não ocorrerá enquanto uma nova tecnologia de redes de comu­nicações domésticas e respectivos aparelhos de consumo se não desenvolver em larga escala, o que não sucederá previsivelmente antes de uma década (a um nível capaz de ter impacto), opinião esta partilhada pela China. Dada por um lado a fra­queza da indús­tria por­tuguesa de electro­do­mésti­cos e outros aparelhos de consumo em Baixa Tensão, e por outro lado a natureza de mer­cado verdadeiramente global de produtos em jogo nestas tec­nologias, não parece que Portugal tenha um interesse prioritário em disputar lide­ranças nesta frente tecnológica das smart­grids.
V.     As micro-redes não se concretizarão, a não ser em certas instalações militares. Uma super-rede continental europeia, pelo contrário, poderá vir a materializar-se, se resolver algumas questões de soberania, mas Portugal não tem condições geográficas adequadas a uma signifi­ca­tiva inter­venção no assunto.
VI.     Nem a “gestão da procura” nem as “super-redes”, que em todo o caso não se materializarão no futuro próximo, resolverão completamente o problema da intermitência de uma exces­siva gera­ção eólica e fotovoltaica. Os EUA, a China e diversos países europeus (da Polónia à Holanda) pla­neiam, por isso, uma importante componente nuclear no mix descarbonizado de geração eléc­trica.
VII.     Qualquer instalação em larga escala de tecnologias “smart” nas redes eléctricas exige a adopção internacional de normas de comunicação. Recentemente a Europa, os EUA e a China chegaram a consenso sobre essas normas, mas apenas no domínio da ciber­segurança e das comunicações usadas nas redes de Média e de Alta Ten­são.
O último ponto tem um particular interesse se se considerarem as tecnologias de Automatização das redes de Média e Alta Tensão (Distribuição e Transmissão), ou seja, as redes que se situam entre as de Baixa Tensão das micro-redes e as especiais em Muito Alta Tensão das super-redes. Um estudo do mercado norte-americano[3] em que, como se viu, a modernização das redes EXISTEN­TES e do seu controlo informático é um dos pilares do projecto das smartgrids, perspec­tiva: “Uma infra-estrutura avançada de contagem e smart meters são as tecnologias fundacionais da rede eléctrica “smart”. Mas esta é mais do que contadores domésticos inteligentes.… Há outros projectos em fases iniciais de implementação de tecnologias e conceitos mais avançados de smartgrids….  A Automatização da Distribuição é a próxima “big thing” em smartgrids…. Para as empresas de electricidade, a sua implantação pode propiciar economias significativas através de melhorias mensuráveis na eficiência operacional, fiabilidade, qualidade de serviço e conserva­ção de energia –todas contribuindo para a satisfação dos consumidores. … A maioria dos gastos das empresas de energia serão em aparelhos de corte na Distribuição e respectivos con­trolos.
É de notar a coincidência das conclusões deste estudo do mercado americano com a opinião apresentada pelo Director da CPFL no Brasil, podendo afirmar-se que, seja qual for o ritmo de evo­lução das tecnologias “smart” na Baixa e na Muito Alta Tensão, a Automatização da Distribui­ção em Média e Alta tensão é algo que sucederá seguramente, visto que se aplica a redes já exis­tentes e para as quais também já existem as normas internacionais de comunicação informática.
Acontece que, por razões históricas, Portugal desenvolveu desde há 30 anos considerável expe­riência académica, industrial e de utilização nas tecnologias de Automatização da Distribuição de energia, o que lhe dá em princípio uma oportunidade de lutar aí por um lugar na liderança das smartgrids. Assim não seja esse “know-how”  perdido em prol de visões tecnoló­gicas determina­das por ideologias utópicas!
[1] O custo só da instalação dos smart meters é estimado, para grandes escalas, em 250€ por unidade, mas alguns sistemas mais simples, como o italiano, terão custado apenas cerca de 70€/unidade.
[2] Groupement Européen des entreprises et Organismes de Distribution d’ Energie, «GEODE Position Paper on Smart Metering», Novembro 2009.
[3] MRG Inc, “U.S. Smart Grid, Beyond the Smart Meter”, Março 2010.

Num próximo post final analisarei o que está a acontecer neste quadro em Portugal.

domingo, outubro 16, 2011

Energia eólica reduz investimentos e perdas na rede?

Um dos benefícios que o lobby eólico e alguns desconhecedores costumam invocar para as energias renováveis é que elas poupam investimentos na rede eléctrica, assim como perdas na sua utilização, porque seriam consumidas no próprio local onde são produzidas, ou pelo menos ali perto.
Ora isso só é verdade para centrais geradoras com potências instaladas muito pequenas ou, sendo maiores, se inseridas em grandes complexos industriais que consomem de facto a maior parte dessa energia - como é o caso da cogeração, quando verdadeira.
Um dos melhores exemplos do que realmente se passa é a situação da produção eólica, que invoca essa economia de redes eléctricas no último documento de publicidade enganosa que tenta passar por "estudo independente" da APREN (um "trabalho" que custou perto de 1/4 de milhão de € e que foi pago por um organismo dependente do Ministério da Economia, o Fundo de Apoio à Inovação).
Com efeito, e como se pode consultar aqui, 44% da potência eólica instalada está directamente ligada à rede de Muito Alta Tensão da REN!
Na verdade, esses 44% directamente ligados à REN incluem parques com mais de 100 MVA (que totalizam 28% de toda a potência eólica instalada), e os restantes são essencialmente parques com mais de 50 MVA!
Nos 56% restantes, ligados à rede de Distribuição, só 10% têm potências instaladas inferiores a 10 MVA e estarão ligados de forma distribuída à rede de Média Tensão.
A larga maioria destes 56%, 46% do total, tem potências entre os 10 e os 50 MVA, e está ligada ou à rede de repartição de 60 kV (a maior parte), ou pelo menos directamente às Subestações da EDP.
Uma das razões disto ser assim são as economias de escala que se obtêm ao juntar os aerogeradores nos mesmos terrenos e partilhando linhas de ligação à rede.
Porém, uma outra razão existe para isto, e que é o método de atribuição de "pontos de injecção" na rede dos parques eólicos (e, em geral, da produção em regime especial, PRE) usado em Portugal.
Este método, ainda que informalmente, continua a ser o preconizado num "Guia Técnico" elaborado em 1988, quando as primeiras mini-hídricas e cogerações começaram a ser instaladas (as eólicas só chegariam uma década depois). Estipulava ele que a relação entre a "Potência de curto-circuito" da rede no ponto de ligação atribuído e a potência a instalar devia ser pelo menos de 20. Esta relação, também conhecida por relação de curto-circuito, visava limitar as perturbações causadas aos consumidores quando um PRE se liga à rede, mas pressupunha certos factos tecnológicos que nunca se vieram a verificar (ver (1)). E, no entanto, essa regra tornar-se-ia norma.
Daqui resulta que se, por exemplo, se quiser instalar um PRE de 10 MW, frequentemente ele se terá de ligar à rede de 60 kV, com o correspondente custo agravado da ligação, e então este custo justifica-se melhor se for possível ligar um PRE de 20 ou mesmo 40 MW...
Há quase 10 anos, quando as eólicas se começavam a instalar, elaborei, a pedido da DGEG, uma proposta de revisão da legislação e regulamentação técnica das condições de ligação à rede dos PRE, mas ficou na gaveta, disseram-me que por boicote da REN e da FEUP, que então tinham grande audiência no Ministério da Economia (a proposta pode ser consultada aqui e o guia técnico da sua aplicação aqui).
A proposta resultou de um benchmarking que fiz do que havia na altura de melhor em todo o mundo, mas só muito recentemente algumas das disposições que eu aí preconizava começaram a ser aplicadas, graças a sugestões da EDP...
De qualquer modo as eólicas vieram trazer novas exigências técnicas e, com o crescente tamanho que vêm adquirindo, dificilmente se podem instalar num quintal...

(1) - O facto principal que aquela regra pressupunha era que os geradores viessem a ser predominantemente assíncronos, exigindo baterias de condensadores, que deviam injectar cerca de 60% de potência reactiva na rede. Com isso e uma relação de curto-circuito superior a 20, a ligação à rede nunca causaria variações de tensão superiores a 3%. Porém, basta que os PRE não injectem nem consumam potência reactiva nenhuma para que aquela variação de tensão seja quase nula, e será mesmo nula se consumirem alguma reactiva, numa dada proporção da activa que injectam. É o que se faz em toda a parte, da Alemanha à Irlanda, e que permite que os PRE possam ser ligados a redes locais, com a única ressalva da potência  real (activa) que injectam na rede menos o mínimo gasto pelos consumidores locais ser comportável pelas linhas.
Assim, tem-se entre nós um perfeito aborto técnico, cuja persistência só se entende pela conjugação de interesses da REN (justificar investimentos desnecessários) com o dos grandes produtores (encarecer o acesso à rede para os pequenos).

sábado, outubro 15, 2011

Perdas no armazenamento eléctrico e o circuito comercial da energia eólica

Como já justifiquei aqui, tenho assumido um rendimento global da bombagem pelas hidroeléctricas reversíveis de 75%, baseado em dados teóricos dificeis de confirmar empiricamente e, na dúvida, preferindo "beneficiar o infractor".
Um desses dados teóricos é um exemplo hipotético constante da memória descritiva do PNBEPH, na pag. 53, que diz "considerando, por exemplo, que nb*nt=0,75...".
Porém, depois de uma busca mais extensa e de algum diálogo com o Ecotretas, comecei a encontrar as tais evidências empíricas que me faltavam, conduzindo-me a valores de rendimento para a bombagem bastante inferiores, 70% na melhor hipótese.
Ora descobri, na própria memória descritiva do PNBEPH, pag. 151 (4.2.2. Valia eléctrica dos aproveitamentos), uma afirmação que me escapara: "...a eficiência global do processo bombagem-turbinamento será bastante inferior a 100% (usualmente 65 a 70% de rendimento global)"!...
Portanto, e considerando ainda as perdas no transporte da energia eólica entre os respectivos parques e as barragens (pelo menos 1.5%), não há dúvida que se pode afirmar com toda a segurança que na bombagem se perde 1/3 da energia eólica armazenada, e não 1/4 como tenho assumido!...
Por outro lado, existe um documento da REN que reconhece que, devido à confluência da chuva com o vento nos Invernos, nem todo o excesso de energia eólica poderá ser armazenado, tendo de se "deitar fora" entre 1 e 3% do total, respectivamente nos cenários de produção eólica que havia e o previsto para 2020. Por conseguinte, a consideração de perdas ainda maiores que 1/3, nesses cenários de produção eólica, e como fiz aqui, não é exagerado.

Vejamos agora como funciona o "circuito comercial" desta energia eólica, de modo a clarificar de vez as mistificações que alguns têm propalado.
Assumamos, por hipótese, que estamos em 2020, com 8500 MW de potência eólica instalada, que produzem em média anual 2100 MW.
Estes 2100 MW médios dão uma ideia da energia anual gerada mas, como já expliquei noutros posts, haverá alturas em que as eólicas estarão a produzir 80 a 90% da potência instalada (7500 MW), e outras em que se ficam pelos 6 a 10% (700 MW), e o sistema tem que ser capaz de viver com esses extremos.
Voltando à energia e seu circuito comercial, os 2100 MW médios são obrigatoriamente aceites pelas redes da REN e da EDP a que os produtores eólicos estão ligados, mas quem compra a energia eólica pelo valor tarifado é o "comercializador de último recurso", a EDP SU ("Serviço Universal"). Este valor é, em 2011, em média, de 9,54 ç/kWh, como se pode ver aqui (o lobby eólico detesta que se mostrem estes números...).

Tendo então pago aos produtores eólicos 1756 milhões de €, por aqueles 2100 MW médios anuais (na realidade e presentemente, como ainda vamos em metade desses 8500 MW, os produtores eólicos também só recebem metade daquele dinheiro, 878 milhões de €), o comercializador vende directamente à EDP Distribuição 2/3 dessa energia, ao valor de mercado médio de cerca de 5 ç/kWh.
Portanto, por 2/3 da energia pela qual terá pago 2/3 x 1756 M€ = 1171 M€, receberá dos consumidores apenas 614 M€ à conta de energia. O resto, 557 M€, será pago pelos consumidores como "custos de interesse económico geral", ou CIEG, neste exemplo a 4,54 ç/kWh - o que faltava para os 9,54 ç/kWh recebidos pelos produtores eólicos.
Continuando o exemplo hipotético, para o outro 1/3 de energia eólica que sobrou, 700 MW em média, não há consumidores, e por isso o comercializador vende-a a preço zero a quem aparecer, e quem aparece são as barragens. Porém, como o pagou a 9,54 ç/kWh aos produtores eólicos, fica com um prejuízo de 585,4 M€, de cujo reembolso a ERSE se encarregará de tratar.
As barragens, que compraram essa energia a 0 ç/kWh, vendem-na, nas horas de ponta, por exemplo a 9 ç/kwh, mas na verdade não toda, porque 1/3 se perdeu no processo; vendem apenas 460 MW em média. Recebem, portanto, 362,9 M€ anuais, o suficiente para rentabilizar o serviço prestado.
Entretanto, os consumidores adquiriram 1400 MW médios pelos quais pagaram os 9,54 ç/kWh devidos aos produtores eólicos (5 à conta de energia e 4,54 à conta de CIEG, como vimos), e adquiriram mais 460 MW das barragens, a 9 ç/kWh.
Mas as contas não estão completas. Faltam os 585,4 M€ de prejuízo que o comercializador teve ao adquirir os 700 MW eólicos a 9,54 ç/kWh para os vender de borla às barragens.
Duas coisas podem agora acontecer.
Na primeira, a ERSE manda repercutir na tarifa dos consumidores aquele valor (eventualmente no ano seguinte), e estes vêm a pagar, portanto, mais 585,4 M€ pelos 1860 MW médios de energia eólica que lhes chegou aos contadores (desprezando as perdas na rede), ou seja, pagam mais 3,6 ç/kWh eólico (585,4 M€/(1860*8760 horas)), naturalmente como CIEG!
Recapitulando, os consumidores adquirem 1400 MW ao preço pago aos produtores eólicos (9,54 ç/kWh) e 460 MW ao preço pago às barragens (9,0 ç/kWh), mas depois pagam ainda 3,6 ç/kWh por cada um desses 1860 MW médios, o que dá um custo total de exactamente 13,0 ç/kWh.
O acréscimo de 3,46 ç/kWh sobre os 9,54 ç/kWh pagos aos produtores eólicos é o sobrecusto sistémico das barragens e das perdas no processo de armazenamento. Totaliza, como vimos, 585,4 M€, dos quais 362,9 M€ são as receitas das barragens, e a diferença, 222,5 M€, é o pagamento da energia perdida na armazenagem, paga aos produtores mas impossível de consumir.
Mas pode acontecer outra coisa.
Pode acontecer que o Governo decida que não quer sobrecarregar já os consumidores, e que portanto os tais 585,4 M€ de prejuízo da EDP SU não sejam repercutidos no tarifário dos consumidores no ano seguinte.
O comercializador fica com esses 585,4 M€ em crédito, que regista como "activo circulante", mas o dinheiro na verdade está em falta.
É o défice tarifário.
Que faz então o comercializador? Vende esse crédito à banca, ("titulariza-o") e recebe o dinheiro.
Quem fica com a dívida agora é a banca, mas esta não tem que se preocupar porque o Estado garante o pagamento do défice que entretanto rende juros. Neste exemplo, 585,4 M€.
Naturalmente, essa dívida vai crescer, por via dos juros acumulados e, por outro lado, ao ter servido para reembolsar a EDP SU do seu prejuízo, esse dinheiro vai faltar à banca para financiar a economia.
É o que vinha a acontecer, e é o que vai continuar a acontecer.
Claro que os 13,0 ç/kWh a que cheguei no exemplo não são tudo o que o consumidor vai pagar, nem sequer tudo o que vai pagar pelo custo da energia eólica. Terá ainda que pagar o backup das térmicas necessárias para quando não há vento e que quando há estão paradas mas prontas a produzir, e ainda o custo da rede eléctrica e os custos de todos os restantes serviços associados.
Mais IVA.

quinta-feira, outubro 13, 2011

Encargos de potência: rendas ou sobrecustos da energia eólica?

Há semanas fui entrevistado para um programa sobre as barragens que passou na RTP 2 há dias, e que pode ser visualizado aqui por quem quiser.

Encargos de potência: rendas ou sobrecustos da... por BBird351
Nesse programa expliquei à jornalista o papel das barragens reversíveis na regularização da energia eólica e como o sobrecusto daí decorrente era imputável àquela forma de produção, mas houve pontas soltas na minha entrevista que não foram convenientemente tratadas pela reportagem.
Uma dessas pontas é a verba que as barragens vão receber a título de encargo de potência, e que o Prof. Joanaz de Melo estimou em 49 M€/ano (eu estimei 52 M€ nestas contas aqui, mas a diferença é um detalhe menor).
O Prof. Joanaz de Melo e a reporter falam desta verba como uma "renda", que as barragens receberão "quer produzam quer não", mas é altura de esclarecer que essa receita corresponde de facto ao pagamento de um serviço, e que esse serviço é absolutamente necessário, pelas razões que vou mostrar.
Um sistema eléctrico tem de ter capacidade instalada capaz de satisfazer a ponta máxima de consumo anual que possa ocorrer, e que por cá é no Inverno. Como pode haver alguma central momentâneamente avariada, e como o consumo pode por qualquer razão metereológica exceder um pouco o previsto (um frio intenso, por exemplo), em geral na península ibérica tem-se uma reserva de 10% sobre essa ponta de potência máxima.
Quer isto dizer, por exemplo, que se se admitir que no Inverno poderemos atingir 9,5 GW de consumo máximo, o sistema tem que prever 10,5 GW de potência disponível para acorrer a essa ponta de consumo.
Numa central termoeléctrica, ou nas hidroeléctricas no Inverno, podemos contar com a sua potência instalada para isso.
Mesmo no que respeita aos produtores independentes mas termoeléctricos, como a biomassa, Resíduos Sólidos, biogás, cogeração, e também nas mini-hídricas, podemos estatisticamente contar com uma parte muito substancial da sua capacidade para ajudar à tal ponta máxima de consumo.
Porém, nas centrais de energias renováveis intermitentes, não!
A energia fotovoltaica, por exemplo, obviamente não gera à noite, e também gera muito menos no Inverno que no Verão.
Porém, o grande problema da nossa rede nesta matéria é a energia eólica, devido à enorme capacidade que ela já tem cá instalada e à que ainda se planeou vir a instalar!
Com efeito, neste momento teremos uns 4,2 GW de eólicas instaladas que, em média anual, produzem 1,05 GWh.ano (17.5% de toda a electricidade consumida anualmente, tanto já como na Dinamarca), e que em certas madrugadas de muitos dias do ano chegam a estar a produzir mais do que o que se é capaz de consumir, razão de ser da armazenagem pelas barragens que a reportagem abordou.
Porém, isto é imprevisível e não se pode contar com isto para a tal ponta de consumo anual pelo Inverno!
De facto, há também muitos dias, em especial no Verão, em que as eólicas só trabalham a 6% da sua capacidade, por falta de vento, e embora no Inverno, quando ocorrem as pontas de consumo, o mínimo com que se possa contar seja um pouco melhor, mesmo assim não ultrapassa os 0,4 GW, menos de 10%!
Ou seja: por mais energia eólica que tenhamos, temos de ter sempre outras centrais que podem estar "a produzir ou não", como dizia o Prof. Joanaz de Melo, mas que realizam um serviço indispensável: o de acorrer à produção, especialmente na tal ponta de consumo anual, no qual praticamente não se pode contar com o vento para o efeito.
E se essas centrais têm que estar disponíveis, têm que ser construídas e mantidas em boas condições. Mesmo que muitas vezes estejam paradas!...
E isso implica um custo.
Custo que, obviamente, resulta da intermitência incontrolável das formas de produção fotovoltaica e eólica. Um sobrecusto que se lhes deve, por isso, imputar por inteiro!
Espero que tenha ficado claro por que razão, mesmo que o plano completamente delirante de virmos a ter 8500 MW de potência eólica instalada se concretizasse, continuaríamos a precisar de praticamente as mesmas centrais hidroeléctricas e térmicas para satisfazer as pontas de consumo, já que não se pode nunca contar antecipadamente com mais de 6 a 8% da capacidade eólica para satisfazer essa necessidade!
E falei em térmicas porque há anos em que há pouca chuva e portanto também não há agua nos rios no Verão, nem vento, e embora no Verão as pontas de consumo sejam menores que no Inverno, em contrapartida ainda há menos vento e menos água nos rios.
Isto não é novidade nenhuma para quem sabe alguma coisa do assunto, e é por isso que nos anos 70 em Portugal se avançou para a construção de algumas termoeléctricas, depois de uma série de anos secos.
E é por isso que boa parte dos tais "subsídios" pagos também às termoeléctricas são ainda sobrecustos da energia eólica; o vento pode reduzir a produção de energia total daquelas térmicas, mas não reduz em quase nada a necessidade de as ter "à mão". E se elas não cobram na energia, é preciso pagar-lhes só para estarem lá.
De facto, o problema da energia eólica, a partir do momento em que atinge quando está no máximo o consumo mínimo de um país (o que já acontece cá), é que só é capaz de andar se tiver duas muletas: uma para as alturas de excesso (muleta da armazenagem), e outra para as alturas de falta de vento (muleta de backup). E na fotovoltaica é ainda pior!
Ora as muletas têm de se pagar!

domingo, outubro 09, 2011

Ingenuidades juvenis e a Madeira

Segundo acabo de ler num jornal, a Empresa de Electricidade da Madeira, EEM, estará a transportar eleitores até às urnas.
Numas eleições que se adivinham renhidas como nunca, gestos destes poderão significar a vitória ou não de Alberto João Jardim. Digo "poderão", porque nem sei se a notícia é verdadeira...
O que a notícia me fez recordar foi a minha única experiência de relacionamento com a EEM, em 1988, já lá vão uns 23 anos. Na altura eu ainda era muito intolerante perante a fraqueza alheia, vindo como vinha de tempos e experiências, na primeira metade dos anos 70, em que o nível de exigência normal era ser-se herói - herói ou proscrito, era a opção...
A história conto-a assim: a EEM defrontava-se com um problema na sua rede eléctrica em que, quando havia um curto-circuito numa das novas linhas de 60 kV da ilha, as protecções não só desligavam essa linha, como deviam, como também desligavam os cabos e linhas de 30 kV que alimentavam o Funchal, que ficava às escuras.
Na EEM pensavam que tinham um problema de selectividade de protecções e, como à época eu era considerado o especialista nacional no assunto, o mesmo veio ter comigo, depois de passar pelo INESC onde ninguém sabia como pegar naquilo. Continuou a acontecer, isso dos problemas difíceis de protecções virem ter comigo...
Antes de tentar analisar propriamente o sistema de protecções que a Madeira tinha eu, como um médico que começa por fazer um exame geral a um novo doente, resolvi fazer uma análise geral da rede eléctrica da ilha, para me familiarizar com ela. Distribuição do trânsito de energia pelas linhas e cabos, cálculo de curto-circuitos, até a estabilidade da rede estudei...
É um tipo de análise corrente em redes eléctricas, que requer programas especiais de computador a que, à época, em que ainda não havia PCs, e muito menos Internet, pouca gente tinha acesso.
Ora logo ao fazer essa análise prévia da rede percebi a origem do problema, que não era um problema de selectividade de protecções, tal como por vezes um aparente problema de rins está num foco infeccioso noutro orgão... !
O problema estava em que, tendo nós aderido à "Europa" e tendo começado a chegar os fundos europeus, a Madeira tinha também começado a fazer grandes investimentos na sua rede eléctrica, e tinha construído e ampliado um conjunto de pequenas hidroeléctricas, no extremo Ocidental da ilha, que ligara ao Funchal, a Sudeste, por linhas de 60 kV. As linhas de 60 kV eram, para a Madeira (como o são nos Açores), as "auto-estradas" da energia e, segundo constava, estas novas linhas tinham atravessado vaus e serras e até tinham sido utilizados helicópteros para a sua colocação, tendo sido inauguradas pelo próprio Presidente da ilha.
O que eu constatava com a análise do trânsito de energia na rede, porém, é que nessas linhas não passava energia praticamente nenhuma, enquanto as velhas linhas e cabos de 30 kV, que iam pela orla Sul da ilha, estavam perto dos limites das suas capacidades. E o que é que acontecia? Acontecia que sempre que havia um curto-circuito (coisa normal numa rede eléctrica) nessas linhas de 60 kV, levando as respectivas protecções a desligá-las, as antigas de 30 kV ficavam com a carga delas e entravam em sobrecarga, seguindo-se a sua correcta desligação pelas protecções respectivas.
O problema, portanto, estava na própria estrutura da rede eléctrica e na forma como aquelas linhas novas de 60 kV tinham sido adicionadas ao sistema da ilha. A rede não era capaz de suportar contingências, como se diz no jargão técnico da especialidade. Apesar de malhada, não tinha "segurança N-1"...
Procurando averiguar, pelo estudo suportado em computador, o que havia de errado, dei-me conta que as linhas tinham sido decididas sem que tivesse havido qualquer estudo prévio da rede resultante e tinham sido concebidas "a olho". De facto, era evidente que se tinha procurado que as linhas fossem curtas, para que a energia fosse preferencialmente por elas, mas elas tinham sido acrescentadas à rede pré-existente, de 30 kV, através de transformadores de 30 para 60 kV colocados nos seus extremos, e o que acontecia é que esses transformadores inseriam uma "resistência" em série com as linhas que impedia a passagem da energia - e ninguém tinha antecipado isso!...
Pouco diplomata como eu era nesse tempo, fiz um relatório a explicar a situação, e a propor medidas correctivas na estrutura da rede, as quais teriam de anteceder qualquer revisão do sistema de protecções. E lembro-me que teci algumas considerações menos elogiosas sobre a falta de um estudo prévio num investimento daquela natureza...
Claro, nunca mais na vida fui contactado pela EEM e nem um "obrigado" recebi por este estudo!
Sei que depois disso a EEM implementou algumas das medidas correctivas da rede que eu propus e muitas outras, e que veio a estabelecer colaborações com outros académicos, mas comigo é que nunca mais quis nada!
Eu, pelo meu lado, por muito tempo considerei que a Madeira era um caso de 3º Mundo, porque se é certo que não tinha que ter especialistas capazes de lhe fazerem estudos daqueles, sempre poderia ter seguido o exemplo dos Açores que, em situação semelhante, recorrera à consultoria externa (ainda que de uma empresa estrangeira). E desde aí sempre achei que havia uma enorme diferença de mentalidade e cultura entre os dois arquipélagos...
Acabei por nunca ir à Madeira, até hoje.
A última vez que passei pela Madeira foi há mais de 50 anos, era ainda criança, em viagem de paquete para Angola. Lembro-me de o barco ancorar ao largo e virem até ele uns pequenos "gasolinas" com uns miúdos que pediam moedas aos passageiros do paquete. Os passageiros atiravam as moedas lá de cima e estas caíam no mar, e imediatamente os miúdos mergulhavam para as apanhar na água.
Aquilo impressionava-me, nos meus 6 ou 7 anos de idade. O mar era enorme e os miúdos, quase da minha idade, eficazes a apanhar as moedas.
Sei que essa miséria acabou e talvez vá de novo à Madeira este fim de ano... Hoje sou muito mais tolerante do que era em 1988 e o povo da ilha vai precisar da nossa solidariedade!

sábado, outubro 08, 2011

Nada muda?

... e, enquanto o Governo hesita sobre se há-de cumprir as recomendações da troika e cortar nas rendas instaladas na Energia, ou ganhar agora uns desejados 0,5 a 2 biliões extra nas privatizações em troca de um défice tarifário de 3 ou mais biliões que há-de vir ter ao Estado daqui a poucos anos, por força do art.º 5 do DL 165/2008, mais um parque fotovoltaico é anunciado que irá sobrecustar aos consumidores mais 11,3 milhões de € ao ano!
De facto, a tarifa da fotovoltaica anda agora em 34 ç/kWh, quando o valor médio de mercado da electricidade assumido pela ERSE anda pelos 4,5 ç/kWh. Por outro lado, é provável que o factor de utilização desta central atinja os 20%, o que permitirá gerar 38,6 GWh/ano. 38,6 GWhx(34-4,5)/100 = 11,3 M€.

segunda-feira, outubro 03, 2011

Acertos e extras sobre a rentabilidade das novas hidroeléctricas

Depois da compilação actualizada das minhas contas sobre as novas hidroeléctricas, um diálogo com o Ecotretas levou-me a rever os cálculos no pressuposto de que o rendimento do processo de armazenagem é, não os 75% que tenho assumido até aqui, mas na verdade inferior a 70%.
De facto, a literatura optimista que preconiza o armazenamento hídrico como forma de regularizar as renováveis intermitentes costuma apontar a banda de 70-82% para os rendimentos do processo, e foi por isso que eu, preferindo pecar por excessiva bondade do que por má fé, tenho considerado o valor médio dessa banda e arredondado para cima.
Porém, toda a literatura que se baseia em dados reais de hídricas de bombagem reais aponta antes a banda de 65-77% (ou seja, menos 5% que a outra), e um dado concreto é a eficiência atingida em algumas grandes barragens chinesas feitas com o apoio técnico da sabedora e experiente EDF: 70%.
Assim, os dados que o trabalho orientado pelo Prof. Peças Lopes (agora ocultado do escrutínio público) e que eu mencionara no post anterior, que efectivamente eram de um rendimento inferior a 70%, devem ser típicos.
Por outro lado, também tenho assumido umas perdas na rede da REN, para o tansporte dos parques eólicos às barragens, de apenas 1%, mas os relatórios da REN mostram que o valor típico anda na banda 1,5-2%.
Assim, e se refizer as contas do post anterior considerando um rendimento total para o armazenamento hídrico de 68, 66 e 63%, respectivamente para uma potência eólica instalada de 4250 MW ( a actualmente existente), 5700 MW (a considerada pela REN para o PNBEPH) e de 8500 MW (a planeada pelo Governo anterior), os resultados modificam-se como mostrarei. O rendimento decrescente que indiquei resulta de, crescendo a quantidade de água bombada, crescerá também a quantidade que terá de ser dissipada abrindo as comportas das barragens, devido à competição com a água da chuva pela capacidade das albufeiras.
Antes de continuar, convém notar que o armazenamento hídrico acresce o custo do kWh de energia eólica em duas parcelas:

- a primeira resulta do custo propriamente do armazenamento, ou seja, essencialmente as receitas das hidroeléctricas pelo serviço prestado;
- a segunda resulta de que, sendo a energia eólica paga directamente aos produtores, o custo para os consumidores é o mesmo mas a dividir por uma quantidade de energia eólica menor, devido às perdas no processo de armazenamento. Ou seja, esta parcela resulta dos consumidores pagarem também as perdas da armazenagem, na origem e ao produtor.

Considerando então agora estes novos rendimentos e que , para os três cenários de potência eólica instalada e admitindo sempre um factor de utilização de 25%, no primeiro (4250 MW instalados, 1062.5 MW produzidos em média) se armazenarão em média 175 MW (1/6), que no segundo (5700 MW, 1425 MW em média) se armazenarão em média 350 MW (1/4),  e que no último (8500 MW, 2125 MW em média) se armazenarão 700 MW (1/3), obtem-se, assumindo como antes 8,5% de taxa de remuneração do investimento e um diferencial de 6,5 ç/kWh entre o preço de venda e o de compra pela EDP da energia eólica:
  • Cenário com a potência eólica actualmente instalada (4250 MW)
Neste cenário a EDP não consegue recuperar o investimento feito. Os custos adicionais para os consumidores resultantes do armazenamento serão:
- receitas das hidroeléctricas - 1,81 ç/kWh eólico;
- pagamento das perdas - 0,45 ç/kWh eólico;
- Sobrecusto total por kWh de origem eólica - 2,26 ç/kWh;
- Adicional de custo por cada kWh consumido no país - 0,4 ç/kWh;
- % de sobrecusto na factura média: 3,7%.
- saldo energético das novas barragens: 136 MW hídricos - 56 MW de perdas (em média) = 80 MW.

  • Cenário com a potência eólica instalada de 5700 MW
Neste cenário a EDP já consegue recuperar o investimento feito, mas ao fim de 50 anos. Os custos adicionais para os consumidores resultantes do armazenamento serão:
- receitas das hidroeléctricas - 1,97 ç/kWh eólico;
- pagamento das perdas - 0,74 ç/kWh eólico;
- Sobrecusto total por kWh de origem eólica - 2,71 ç/kWh;
- Adicional de custo por cada kWh consumido no país - 0,62 ç/kWh;
- % de sobrecusto na factura média: 5,8%.
- saldo energético das novas barragens: 136 MW hídricos - 120 MW de perdas (em média) = 16 MW.

  • Cenário com a potência eólica instalada de 8500 MW
Neste cenário a EDP recupera o investimento feito em 13 anos. Os custos adicionais para os consumidores resultantes do armazenamento serão:
- receitas das hidroeléctricas - 2,16 ç/kWh eólico;
- pagamento das perdas - 1,12 ç/kWh eólico;
- Sobrecusto total por kWh de origem eólica - 3,28 ç/kWh;
- Adicional de custo por cada kWh consumido no país - 1,07 ç/kWh;
- % de sobrecusto na factura média: 10%.
- saldo energético das novas barragens: 136 MW hídricos - 266 MW de perdas (em média) = -130 MW.