terça-feira, janeiro 25, 2011

Não é só cá!

No post em que publiquei uma reflexão feita para a EFACEC há 14 anos, mencionava o conteúdo esforçado dos doutoramentos americanos, com uma forte componente curricular e uma Tese cuja preparação exigia aproveitamento com "A" nas disciplinas precedentes, e comparava isso com o facilistimo dos nossos doutoramentos da altura, e com os actuais.
Um leitor irado escreveu-me a dizer que agora já havia muitas Universidades americanas que ficavam satisfeitas com "B" nas disciplinas de doutoramento. E provavelmente tem razão!...
Numa interessante entrevista, o Prof. S. Sachdev, uma das figuras internacionais mais proeminentes de uma das minhas áreas de interesse e um homem suave e conciliador, narra a sua experiência como Professor numa Universidade canadiana, onde fez carreira após 20 anos de experiência na indústria. E, perguntado sobre se via diferenças entre os estudantes que tinha no início da sua vida de Professor, nos anos 70, e os dos finais dos anos 90, dizia:
"I see a tremendous difference in the Canadian students of the 1970’s and 1990’s.  In 1970, I instructed a final year class of 30 students.  About one-half of those students had a few years experience working with technologies.  Those students joined the engineering program to enhance their knowledge and understanding of engineering principles.  Those students made sure that their colleagues paid attention to the instructions; I did not have to make any effort in maintaining the discipline in the class.  After every examination, they always came to me to discuss the problems they could not handle.  They never complained about the marks they received for their answers.   In the 1990’s, maintaining discipline in the class was one additional task of the instructor.  Some students would disturb others by talking while the lecture was going on.  The average student did not have much interest in learning; they wanted to get a degree so that they would be able to land a job.  After the examination, many students wanted higher grades without understanding why their grade was not what they would have liked to see.  Of course the smart students continued to be good, thoughtful and concerned about understanding the techniques and technologies. "

Esta evolução da atitude e valores dos estudantes norte-americanos reflecte-se naturalmente no grau de exigência das Universidades, e tem por isso muito interesse o artigo hoje publicado no New York Times.
Depois de referir um outro artigo segundo o qual um estudo da Universidade da Califórnia mostrou que de 1961 para 2003 o número de horas semanais de aulas e estudo dos estudantes se reduziu de 40 para 23, o NYT cita um outro estudo recente, abrangendo dezenas de Universidades, e  que mostra que os estudantes americanos aprendem agora muito pouco nos dois primeiros anos de Universidade. Na verdade, o número médio de horas semanais de estudo é agora de... 12!
Outro investigador americano em Educação comentou estes resultados dizendo que "No work, all play, no job". E desenvolveu: "Owing to the generally weak state of K-12 schooling, most high school graduates are not accustomed to serious academic work. They enroll in college with the expectation that it will be a continuation of K-12, that is, undemanding. What most of them want is just a credential attesting to their employability, accompanied by as much fun as possible." E de seguida acusava: "Wishing to keep such “students” happy and enrolled, many schools have acquiesced in or even encouraged the faculty to lower academic standards. High grades are encouraged lest students get angry and drop out when graded on their true performance".
Parte do desemprego dos nossos licenciados tem sem dúvida raízes semelhantes.
Mas um facto que evidencia que o mercado de trabalho não se compadece com fracas preparações também se começa a notar. Um Mestre em Eng.ª Electrotécnica do IST continua a ter emprego praticamente garantido, hoje em dia, mas o ordenado de entrada anda agora frequentemente nos 800€ e raramente supera os 1000€.
Contas feitas e actualizando valores à taxa de inflacção, isto é 20 a 40% abaixo dos ordenados de entrada dos licenciados de há 15 anos...

3 comentários:

Lura do Grilo disse...

Maio de 68 e seus derivados foi uma tragédia que nos chega a conta gotas.

Vai ser duro mudar, muito duro!

Anónimo disse...

" o ordenado de entrada anda agora frequentemente nos 800€ e raramente supera os 1000€."

Mas se o licenciado/mestre de bolonha for de economia ou gestão os ordenados já são melhores. Talvez os tais 20% a 40%.
As perspectivas de carreira,seja onde for, também são muito melhores.

Mas isto é tudo um pouco retórico já que tanto os licenciados/mestres de Bolonha de enconomia/gestão ou de engenharia padecem do mesmo mal. Pouco estudo, poucos conhecimentos, pouca exigência e demasiado PowerPoint. Isto tem consequências muito graves.

Jorgex disse...

E eu que penso seriamente suspender a minha licenciatura de Eng. de Materiais...

Concordo com este post, ou seja, eu apenas quero a licenciatura para obter um trabalho com um rendimento decente. Ponto final.