sexta-feira, abril 22, 2011

Energia, essa desconhecida

Publicado no "Expresso" de 16-04-2011:

O Expresso de 26/Fevereiro/2011 publicou dois artigos de opinião fazendo o panegírico da política energética do actual governo: “O Mundo da energia tem os olhos postos em nós” do Director Geral da ADENE e “Energia, sustentabilidade e populismo”, do Presidente Execu­tivo da ENEOP. Pode-se entender a propaganda, mas convenhamos que qual­quer pessoa que tenha lido nos últimos meses a imprensa estrangeira sabe que infe­lizmente se “o Mundo tem os olhos postos em nós“ é por causa dos graves problemas de endividamento que nos afec­tam…
Os signatários pretendem assim contribuir para o esclarecimento da opinião pública sobre a situação energética portuguesa. A Energia terá de ser uma ferramenta ao serviço da compe­ti­tividade da Economia de Portu­gal, mas é exactamente o inverso que tem acontecido nos últi­mos 15 anos.
Desde logo, para as empresas os preços de electricidade sem IVA, que é o que conta para a sua competitividade económica, são cerca de 15% superiores aos da média europeia e 40% superiores aos franceses. Para as famílias também são superiores à média europeia e 40% superiores aos franceses se se descontar a subsidiação relativa de um IVA muito inferior ao cobrado em média na Europa. E isto sem contar com o “défice tarifá­rio” que pesa sobre os consumidores portugue­ses!
Depois, o valor médio da energia eólica que consta do documento ofi­cial da ERSE para 2011 é de 90,54 €/MWh, muito acima do valor de referência do mer­cado que é de 52 €/MWh. E isto para não falar nos Decretos Leis que garantem valores de cerca de 350 €/MWh à electri­cidade fotovoltaica, e de 587 €/MWh à de microgeração.
Mas, mais grave, é o facto destas formas de energia serem intermitentes e incontrolá­veis, o que acresce um pesado sobre­custo sistémico a estas tarifas e que a “previsão e a gestão” não resolvem.
A intermitência significa que a produção dos aerogeradores varia drasticamente quando o vento muda ligeiramente, e a dos painéis fotovoltaicos quando o sol se põe ou, até, alguma nuvem o encobre ligeiramente!
Ora quando se promoveu a construção dum parque eólico que atinge hoje uma potência ins­talada de 4000 MW mas apenas 1000 MW em produção média, o governo teve que garantir por Decreto Lei que toda a energia eólica produzida tem de ser paga aos seus produto­res, seja ou não consumida.
Porém, devido à referida intermitência, esta garantia exige que relati­vamente a toda a potência instalada haja investi­mentos adicio­nais vultuosos:
- por um lado é necessária uma “potência de substitui­ção” em cen­trais térmicas porque, não sendo possível saber se na ponta de consumo anual vai, ou não, haver vento e água nas barra­gens que cheguem, o sistema electroprodutor tem que ser dotado com reservas;
- por outro lado é preciso aproveitar a electricidade eólica produzida nas horas de vazio em que não há consumo que a “encaixe”, fazendo bombagem para centrais hidroeléc­tricas de albufeira, processo em que ¼ da energia é dissipada em per­das e que nem sequer sempre fun­ciona, pois quando a chuva compete com o vento pela capa­cidade das albufeiras estas têm que simplesmente abrir as comportas, ou a electricidade ser exportada a preço zero.
Ora estes sobrecustos acrescem às tarifas pagas aos produtores de energia eólica, e são incluí­dos nos CIEG (Custos de Interesse Económico Geral). E é o conjunto destes sobre­custos que não para de subir, como assinalou o Conselho Tarifário da ERSE no seu último documento oficial.
Por outro lado, os números apregoados relativos a novos empregos são completamente fan­ta­siosos. Em toda a Europa, e segundo a própria associação europeia de energia eólica, terão sido criados 10,5 mil empregos anuais, mas 75% deles só nos 3 países que cria­ram e desen­volvem as respectivas turbinas, o que não inclui Portugal. Quanto à redução de importa­ções de combustíveis fósseis em 2010, devida essencialmente a um ano chuvoso de que as nossas hidroeléctricas muito beneficiaram, terá sido de 174 milhões de euros mas em carvão e gás natural, sem que um barril de petróleo tenha sido poupado com isso!
A aposta da política económica portuguesa em bens transaccionáveis não é compatível com esta politica irrealista de fomento de sobrecustos da respectiva base energé­tica.
E é isso que tem que ser corrigido, começando por uma análise global e fundamentada de todos os cenários tecnológicos possíveis de utilização de todas as fontes de energia primá­rias disponíveis.

 José Luís Pinto de Sá e Clemente Pedro Nunes, Professores do Instituto Superior Técnico

Sem comentários: