A Universidade de Carnegie-Melon (CMU), um dos suportes do projecto "MIT-Portugal" decidido pelos nossos grandes líderes como eixo da internacionalização que eles acham que faltava à nossa Investigação Universitária, tem-se entusiasmado a fazer protótipos de carros eléctricos. Porém, um grupo de investigadores seus de Engenharia Mecânica publicou há cerca de um ano um excelente trabalho sobre a estrutura que terão de ter os automóveis híbridos carregáveis eléctricamente (PHEV) e as respectivas implicações em autonomia, consumos e dimensões - note-se, de passagem, que nem sequer se põe a hipótese de automóveis puramente eléctricos, na I&D internacional...
O estudo nota que para que um PHEV tenha uma autonomia da ordem dos 170 km (100 milhas), precisa de ter uma bateria enorme (de iões de lítio), e todo o carro tem depois de ter uma dimensão proporcional - o chassis, e os motores necessários para carregar o peso da bateria e do chassis. Além disso, os consumos serão também consideráveis, dada a massa do carro determinada principalmente pela bateria.
Naturalmente, trata-se de uma concepção integrada do automóvel, como é natural, e não a anedota que há tempos andou por cá e que até teve honras de TV, de adaptar os carros actuais a essa aplicação (o que, como na altura ironizei, era uma ideia similar à dos construtores dos primeiros automóveis do sec. XIX, que basicamente montavam motores em carruagens de cavalos).
Num automóvel normal, 38 litros de gasolina pesam 28 kg e contêm 360 kWh de energia; uma bateria de iões de lítio com 30 kWh (8% daquela energia) pesa uns 300 kg a que se soma outro tanto de reforço da estrutura que a suporta e que têm de continuar a ser transportados mesmo depois da bateria descarregada, ao contrário do depósito de gasolina, que se vai tornando mais leve à medida que esta é consumida.
Por outro lado, para manter as características dinâmicas deste automóvel (aceleração e travagem), dado o aumento de peso da bateria e da estrutura, o PHEV tem também de ter motores e travões mais potentes, o que lhe aumenta ainda mais o peso.
O estudo desenvolveu assim modelos de vários PHEV em que variava a capacidade da bateria e portanto a autonomia do veículo, com um custo estimado para a bateria de 700 €/kwh (cerca de 20 mil € para uma bateria de 30 kWh, a preços de 2008). Com estes modelos estudaram-se os custos de diversos modos de funcionamento, assumindo uma vida útil de 12 anos para o automóvel com uma mudança de bateria a meio dessa vida (cenário optimista, visto que 7 anos é a máxima duração conseguida para as baterias de iões de lítio em condições ideais de laboratório, sendo mais de esperar uma vida útil de 4 anos nas condições reais de utilização).
O resultado do estudo é que para PHEV com autonomias acima de uns 30 km, eles ficarão sempre muito mais caros, incluindo o custo da electricidade, que os automóveis actuais - considerando que os preços da electricidade, mas também os da gasolina, são nos EUA metade do que são cá.
Para pequenos PHEV com autonomias de uns 20 km o custo reduz-se consideravelmente, porque requerendo baterias menores todo o carro pode ser mais leve e também o custo de substituição da bateria terá menor peso no custo total do automóvel ao longo da sua vida.
Ou seja: os PHEV tenderão a distinguir-se entre pequenos, para os pobres, e grandes, para os ricos. Mas, enquanto nos automóveis normais hoje em dia a diferença mecânica principal está na potência, nos PHEV estará na autonomia.
Os pequenos PHEV com autonomias de 20 km exigem, porém, a existência de imensos parques de estacionamento urbano com carregadores de electricidade, além dos sistemas de carga em casa, porque não terão autonomia sequer para ir e voltar de casa ao trabalho.
A Toyota, a pioneira criadora dos primeiros híbridos (de que o Prius continua a ser a referência) acha que, face a esta previsão de custos, é duvidosa a adesão que os PHEV virão a ter dos automobilistas e a rapidez com que virão a penetrar no mercado. E, por tudo isto, o "National Research Council" norte-americano, um Departamento da Academia de Ciências dos EUA, publicou recentemente um outro estudo em que conclui que a penetração dos automóveis híbridos carregáveis electricamente irá ser muito lenta, ao longo dos próximos 30 anos, enquanto a tecnologia de baterias for a existente e a menos que haja uma subsidiação macissa por parte dos Governos. O que coincide exactamente com a previsão que tenho feito por aqui.
Ora, como já notei aqui, presentemente no nosso país 2/3 do preço da gasolina é de impostos, enquanto pelo contrário a electricidade é subsidiada com um IVA de apenas 5% e um défice tarifário que lhe esconde o custo real. Não se vê onde poderá o Governo, a braços com um grave défice de contas públicas, vir a prescindir dos impostos dos combustíveis e a trocá-los pela subsidiação à electricidade, e o mesmo para os próprios automóveis, de uma forma sustentada.
Claro que os militantes da ordem nova ecotópica e os demagogos dos respectivos negócios invocarão que, com a subida do preço do petróleo, não haverá outra alternativa. Mas, ao mesmo tempo, escamoteiam a subida do custo da electricidade que a opção fundamentalista pelas energias renováveis irá acarretar.
Pode ser que com o domínio dos media transformados em máquinas de propaganda contínua, o silenciamento das vozes desalinhadas e, mais tarde ou mais cedo, a "recolha" dos dissidentes em suas casas pela calada da noite, estes desígnios se venham a conseguir realizar por cá e até talvez na União Europeia.
Mas no que não acredito é que o Mundo fora de Europa vá nisso. E, se a História nos ensina alguma coisa, receio que mesmo na Europa isso não aconteça sem sangue.
Oxalá que me engane...
3 comentários:
Um outro excelente post em mais um exercício salutar de liberdade intelectual. Um convite para pensar e consequente recusa da propaganda por muito "verde" e "politicamente correcta" que seja.
Caro Prof. Pinto de Sá,
Acabo de ler, no Jornal de Negócios de hoje, a publicação, classificada como "publicidade", da tradução do sumário executivo do estudo catalogado como a experiência alemã nas energias renováveis editado pelo Rheinisch-Westfälisches Institut für Wirtschaftsforschung.
Saúdo esta iniciativa e prontifico-me a co-custear as despesas de inserção no jornal pois classifico este aconteccimento como um verdadeiro acto de cidadania. Diga-me como poderei fazê-lo.
Excelente exposição que está ao alcance de qualquer um.
Há também algo sobre o carro puramente eléctrico que nunca vi abordado. Trata-se do problema de operar as baterias com baixas temperaturas.
Há também avanços que poderão colocar o carro para as calendas gregas http://spectrum.ieee.org/energywise/green-tech/advanced-cars/supercritical-fuel-combustion-could-drastically-improve-efficiency
Os fabricantes tentam manter-se modernos mas as expectativas são reduzidas:
http://spectrum.ieee.org/green-tech/advanced-cars/loser-why-the-chevy-volt-will-fizzle
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