Ora vejam esta pérola acessível no "Expresso" on-line: o TGV poderá produzir energia renovável: diz que o TGV terá umas pequenas ventoinhas entre os carris que, accionadas pelo vento da deslocação, poderão gerar electricidade "renovável"!
Se os jornalistas que escreveram esta enormidade tivessem aprendido uns rudimentos de Física, saberiam que as ventoinhas, ao rodarem como indicado, funcionam como travão do TGV e que a energia que este tem de dispender para vencer essa travagem é sempre maior que a que as ventoinhas poderão produzir, visto que nenhum processo de transformação de energia tem rendimento maior que 1!
Pelo que o TGV gastará sempre mais energia com este processo do que se gerar directamente a electricidade (para a iluminação interna) a partir dos seus motores...
Alguns leitores manifestaram-me o seu espanto pelo que aqui postei, e por isso vou adicionar alguma informação explicativa. A ideia aqui apresentada está melhor explicada aqui, onde também se vêm as tais T-box, entre os carris, e em substituição (aparentemente), das travessas.
Num comboio de alta velocidade (TGV), a aerodinâmica é a questão chave. Quem quiser instruir-se, pode talvez começar por aqui.A potência necessária para vencer a resistência do ar é tal que, além de justificar aturadas pesquisas sobre a forma óptima do comboio e em especial do seu nariz, de modo a reduzir essa resistência, uma das opções que mais se tem procurado é que o comboio não sofra o atrito dos carris, fazendo-o levitar.
Com isto, consegue-se que um TGV normal que não levite use perto de 8 MW de potência para vencer todo esse atrito do ar e carris, mas a parte dessa potência necessária para vencer o atrito do ar por baixo do comboio é pequena, quiçá menos de 0,5 MW.
Essa potência por baixo do comboio produz grande turbulência e as travessas geram ruído (de baixa frequência), que é energia sonora resultante da perturbação do ar.
Ora, na ideia apresentada diz-se que o Tbox poderá gerar 897 kWh numa viagem do TGV de 345 km a 300 km/h. Portanto, o TGV passará para essas ventoinhas uma potência tal que elas gerarão 0,897 MWh/1,15 horas = 0,78 MW (2,6 kW x 300 travessas para os 200 metros de comprimento do comboio). Mas, para gerarem isso, e dado que segundo a lei de Betz o rendimento máximo de uma turbina eólica é de 59% mas na prática não ultrapassa 35%, e considerando ainda o rendimento da conversão em electricidade (menor que 100%), o sistema entregará, no máximo, 33%, ou 1/3, da potência que recebe do vento. Portanto, para gerar 0,78 MW tem que receber no mínimo 2,34 MW do comboio na forma de vento - bastante mais que os cerca de 0,5 MW que ele dissipa, no máximo, nessa turbulência que gera por baixo de si.
Isto só é possível, claro, se a forma das Tbox funcionar como um travão aerodinâmico, para ir buscar mais energia ao comboio. Da qual nunca conseguirá aproveitar mais que 1/3!
A ideia subjacente a esta "invenção" é que a deslocação de ar causada pelo comboio contém uma grande quantidade de energia que de outra forma se perde. Ideia errada! E de que, mesmo que fosse verdade, nenhuma máquina conseguiria jamais aproveitar 100% - 33% e já não é mau!...
O problema é que, como noutras ideias similares, tais "inovações" nascem nuns "criativos" sem a bagagem que só o trabalho e o suor permite obter. Ou em "malta criativa" à procura de subsídios para "viabilizar" estas ideias...
16 comentários:
Desculpe mas eu não concordo assim tanto. As ventoinhas estão colocadas no chão e não no comboio. Ou seja, o comboio ao passar cria uma massa de ar a alta velocidade que é aproveitada por ventoinhas fixas que estão colocadas no chão, entre os carris.
Como é que algo que não está fisicamente ligado ao comboio pode funcionar como travão?
Cumprimentos
Não sei se percebi bem... ora o seu comentário ora o funcionamento da referida T-Box.
Se eu estiver na estação perto da linha do comboio e passar o alfa a alta-velocidade, os meus cabelos esvoaçam, certo? Se invés dos meus cabelos eu colocar uma pequena ventoinha ela gira, ou não?
Os meus cabelos a esvoaçar ou a pequena ventoinha a girar criaram alguma resistência à passagem do comboio, ou simplesmente o facto de o ar já deslocado pelo comboio terá causado este efeito?
A minha pergunta é, se esse tal aparelho está "fora" do comboio, apenas está a aproveitar a deslocação de ar que é causada pelo comboio, não?!
Obrigado
Já agora, podiam montar à frente do TGV uma turbina que produziria energia para o TGV andar e nem sequer seria fornecer-lhe electricidade, só era necessário os passageiros darem-lhe um "EMPURRÃO" PARA COMEÇAR A MOVER-SE :).
Outra alternativa era fazer as linhas sempre a descer :)
Caros Pintado e Pedro:
Qualquer objecto que perturbe o fluxo laminar de ar junto à linha provocará turbulências e um efeito de travão aerodinâmico sobre o comboio, principalmente às velocidades que o TGV atinge.
Qualquer pessoa poderá sentir isso se, por exemplo, se cruzar de automóvel com um camião TIR a boa velocidade numa estrada estreita, ou se esta passar por uma ponte de treliça metálica acima da via (como a antiga ponte da Chamusca, por exemplo). O efeito é por vezes tão grande que parece que alguém travou violentamente.
É que o que os jornalistas asininos estão a sugerir iria realmente aumentar o consumo do TGV em valores muito superiores às «gotas» de electricidade produzida.
"diz que o TGV terá umas pequenas ventoinhas entre os carris que, accionadas pelo vento da deslocação, poderão gerar electricidade "renovável""
Não rebolo no chão a rir: a minha mulher ralha.
Tanta ignorância, tão absoluta, tão total que confrange.
É verdade que sou desconfiado destas "ideias", mas por momentos pareceu-me fazer sentido.
É verdade... falta-me a tal bagagem =)
Com a explicação, ficou mais claro, obrigado! :)
Implementado dá uma espécie de esquema para transferir dinheiro da electricidade gasta pelo comboio para uma empresa de alguém.
Deixem-me ver se percebo isto...
A ideia é instalar ventoínhas ao longo da linha do TGV para para produzir energia com o "vento" da passagem dos comboios?!?!?!
Portanto cada ventoinha produziria apenas no segundo em que o TGV passa? Ou estão sempre a passar TGVs ou então parece-me que o factor de utilização andará muito abaixo do 1%...
Se a isso somarmos a pioria aerodinâmica do TGV nem é preciso entrarmos em grandes contas para perceber que isto é um enorme disparate.
O mais preocupante é que parece estar a ser utilizado para promover o TGV. Por isso o TGV deixa de ser apenas para transporte de pessoas e passa também a produzir energia. Que espectáculo!!!
Com jornalistas e politicos destes Portugal só pode cada vez ficar mais pobre.
Bem, eu nem fiz contas à economia da coisa... :-))
Mas a ideia é que cada Tbox terá, de facto, uma utilização de uns 2,4 s por cada passagem de TGV (tempo que este, tendo 200m, leva a passar a 300 km/h).
Haverá é 1 Tbox a cada 0,66m, portanto e para a linha de 345 km dada como exemplo, 517500 Tbox!...
Em cada momento, à medida que o TGV de 200 m se desloca a 300 km/h, haverá 300 Tbox debaixo dele a gerarem 2,6 kW cada - portanto 780 kW, no conjunto das 300 Tbox.
O conjunto de 300 Tbox que estará a produzir desloca-se com o TGV.
Claro que tudo isto é puramente especulativo, porque falta ver o estudo aerodinâmico face à turbulência do vento por baixo do TGV, contabilizar a inércia das ventoinhas (em 2,4 s provavelmente nem têm tempo de começar a mover-se), etc... e isto sem falar, finalmente, na questão de saber se o custo do mais de meio milhão de Tbox necessárias, mais todo o circuito eléctrico de 345 km e electrónica associada, pode ser recuperado pelos 50€ que valem 897 kWh no mercado de energia...:-))
Ao ler a notícia lembrei-me disto: http://www.makeuseof.com/tech-fun/laptop-self-charger-never-run-out-of-power/
:)
Tudo isto lembra-me de sobremaneira o mito do motor de «moto continuo», ou de movimento perpétuo, apenas possível se, vencendo a inércia inicial, trabalhasse num universo sem atrito, o que é, obviamente, uma miragem.
Fantástico! É bom saber que também no estrangeiro há cursos de engenharia tirados ao Domingo...
Pedro, Montijo
Caro professor:
Penso que cometeu um erro nos seus cálculos. Segundo o que eu li, os "inventores" desta coisa propõem 150 T-Boxes por cada quilometro. O que quer dizer que no comprimento do comboio "caberiam" 30 aparelhos, e não 300 como referiu. Ou seja no comprimento total de 345 km seriam necessários 51 750 aparelhos.
Já agora esta "invenção" faz lembrar outra do género, que até teve direito a tempo de antena num programa da Júlia Pinheiro na TVi, à uns anos atrás, que falava de um carro electrico "movido" por duas turbinas de reacção, acciondas pelo pela deslocação de ar que o próprio veículo é sujeito na sua locomoção! São coisas que só dão é vontade de rir...
Não, não cometi nenhum erro. Consulte os links que eu inseri e confirme por si mesmo.
"The distabce between sleepers is 660mm", dizem os autores. 660 mm são 0,66 metros. Aliás, só assim as contas batem certo com as alegações dos autores, como pode verificar por si mesmo. Não custa muito, vá lá! São só contas de somar, dividir e multiplicar...
Peço desculpa então pelo lapso. Mas na referência a que tive acesso lia-se: "China's Jiang and Italy's Luparini reckon that about 150 of these devices could be installed along a kilometer (0.62 miles) of track and as a train speeds along, the turbines inside the device would generate electricity."
Penso que não está em casa a minha capacidade fazer contas de somar, dividir e multiplicar, mas sim erros de transcrição de diferentes referências...
Caro Aguiar,
Quem transcreveu a notícia que voc^leu é que não sabia fazer contas - deve ter "convertido" 660mm para 6,6m... :-)))
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