É entretanto de notar que este número de 100 mil empregos é uma "revisão em alta" do número que o mesmo Governo apresentou ainda há um ano no seu PEC 1, e que era de 30 mil, que na ocasião também desmontei vincando que se baseava num trabalho feito por encomenda de outra empresa consultora, a Deloîtte, que em finais de 2008 alardeara a existência de 36 mil empregos no sector das renováveis em Portugal.
O relatório da Deloîtte fora apresentado à Imprensa com grande pompa e circunstância num grande hotel de Lisboa, mas o relatório em si custou a ficar acessível ao público. Quando ficou, porém, tornou-se possível verificar que o número de empregos reais e directos recenseados no sector das renováveis era de 2400, e que os restantes 33 600 eram "empregos indirectos" - ou seja, e como mostrei, pura e simplesmente congeminados!...
Porém, esta criatividade inventiva quanto aos empregos gerados pelas renováveis não é exclusivo nacional. Como notei há pouco mais de um ano, também na Alemanha um estudo económico sério (e até pró-renovável!) contabilizava em 157 mil empregos os criados na Alemanha pelas renováveis (dos quais 64 mil nas eólicas e, destes, directos e recenseados apenas 27,5 mil), enquanto na mesma altura um estudo encomendado e publicado pelo próprio Comissariado Europeu da Energia (há muito ao serviço dos nacionais-ecologistas alemães) duplicava "criativamente" aqueles empregos para... 320 mil!
Como nota à margem, vale a pena recordar que o mesmo estudo recenseava 52 mil empregos na electricidade alemã gerada a partir da biomassa, a mesma ordem de grandeza do emprego existente nas eólicas lá, e isto apesar da indústria de equipamentos de biomassa exportar muito menos que a de aerogeradores, de a produção eléctrica a partir da biomassa requerer apenas 1/3 do investimento da da eólica por kWh gerado, e de a biomassa produzir lá a mesma ordem de grandeza de energia renovável (5.2%) que o vento (6.5%)...
O estudo alemão em referência contêm também outro dado precioso: uma estimativa quantificada, a partir de modelos económicos de Input/Output usando estatísticas oficiais, do número de empregos indirectos criados pela indústria eólica - 4/3 por cada directo, a maioria dos quais na produção de máquinas eléctricas e componentes associados (vd. figura).
Ora desde que o estudo da Deloîtte foi feito, em 2008, que aconteceu por cá que permita considerar um aumento do emprego nas energias renováveis em Portugal?
Recordo que, em 2008, a ADENE promovera um inquérito às nossas empresas e obtivera o único número fundamentado em inquéritos disponível até agora nesta matéria: 800 empregos. Esse número tem sido referido por diversos fóruns internacionais, como este aqui que o cita a propósito do relatório sobre criação de emprego da própria EWEA, e que lhe adiciona os cerca de 2000 empregos criados pela ENERCON em 2009-2010 nas fábricas de Viana do Castelo - que, com alguns fornecedores de componentes, ascenderão optimisticamente a 2400, o número citado pela Deloîtte e pelo próprio líder da ENERCON em Portugal, Aníbal Fernandes, há cerca de um ano.
O número de empregos associado à operação e manutenção (O&M) dos parques eólicos é muito baixo, mesmo incluindo a guarda dos parques (frequentemente inexistente), e é sabido que muitos deles são tele-monitorizados a partir do estrangeiro e nem sequer têm técnicos portugueses em permanência em Portugal. Há empresas em que um único técnico supervisiona 100 MW de aereogeradores, e a extrapolação deste número para os 4000 MW existentes leva a apenas algumas dezenas de empregos. Com efeito, a maioria dos 800 recenseados pela ADENE em 2008 realizavam projecto e instalação de novos parques, e esse número não terá crescido significativamente desde então - na verdade, a técnica do relatório da CEEETA, Lda de estabelecer uma proporcionalidade entre potência eólica instalada e empregos não tem a mínima fundamentação!
Somos assim conduzidos, para a energia eólica, a um total entre 2400 e 3200 empregos directos existentes em Portugal.
O número de empregos indirectos é certamente menor, já que o multiplicador de 4/3 calculado na Alemanha se aplica sobretudo ao fabrico, e que parte desse emprego, em particular a fatia ocupada em Investigação & Desenvolvimento, é realizada no estrangeiro cuja tecnologia usamos - mas, mesmo assim, concede-se que se possam extrapolar 4200 empregos indirectos criados pela energia eólica em Portugal dos quais 400 já contabilizados nos fornecedores associados às fábricas de Viana do Castelo (se o total de empregos directos for de 2800, serão 4/3 de 2800=3700). Teremos, portanto, e na hipótese favorável assumida daqui em diante, 3200 empregos directos e 4200 indirectos (total de 7400).
Adicionalmente à energia eólica temos a construção das barragens reversíveis e a instalação de reversibilidade em antigas (enganadoramente referidas como "reforços de potência") e que são complementares das eólicas, e cuja criação real de empregos já contabilizei aqui, vai para 2 anos: 5 400 em média durante os 10 anos de construção das centrais mas, depois de terminadas, para a sua O&M, apenas... 84! Neste momento a construção vai sensivelmente a meio.
Quantos empregos indirectos são criados por estas obras hidroeléctricas? Um estudo canadiano mostra que, em média, são criados 2/3 de emprego indirecto por cada directo na construção de hidroeléctricas, o que adiciona, portanto, e durante o período de construção, mais 3600 empregos indirectos estimáveis.
A estes números relativos á energia eólica e à expansão das hidroeléctricas temos a adicionar as mini-hídricas, a energia solar, as centrais térmicas a biomassa e a resíduos.
Em Portugal há cerca de 100 mini-hídricas mas, tal como as eólicas e as grandes hídricas, são automáticas e com poucos requisitos de manutenção. Podemos, entretanto, admitir generosamente um emprego e meio por central, o que totalizará uns 150 empregos directos.
Em Portugal há cerca de 100 mini-hídricas mas, tal como as eólicas e as grandes hídricas, são automáticas e com poucos requisitos de manutenção. Podemos, entretanto, admitir generosamente um emprego e meio por central, o que totalizará uns 150 empregos directos.
Na energia solar existe o anunciado grande projecto da RPP Solar de Alexandre Alves, que anunciava a criação de 1900 empregos subsidiados com dezenas de milhões de € e sobre o qual eu aqui levantei dúvidas há um ano, infelizmente alarmantemente confirmadas pelas notícias mais recentes desse projecto. Empregos criados, raros, e ao que parece os subsídios esfumaram-se para parte incerta...
Entretanto, a fábrica que a Acciona construiu em Moura como contrapartida da megalómana central fotovoltaica da Amereleja (de que entretanto 1/3 foi vendida à Mitsubishi) arrancou em 2008, empregando 95 trabalhadores. A central em si empregará 15 pessoas em manutenção, e as outras pequenas centrais fotovoltaicas existentes no país quiçá outros 10, mas em Moura foi também criado um Laboratório que empregará ainda uns 10 elementos. A Martifer Solar, porém, empregava 290 pessoas em 2009 em 8 países, das quais quiçá 200 a 220 em Portugal, em particular na sua fábrica de Oliveira de Azeméis.No total e assim, a energia solar suportará directamente em Portugal 350 empregos directos, a que se poderá aplicar um factor multiplicador generoso de 1,1 para o cálculo do número de empregos indirectos, assim estimados em 400, arredondando para cima.
Finalmente e para a produção renovável termoeléctrica, cada central de 10 MW a biomassa emprega, de acordo com um inquérito feito a empresários do sector, directamente 20 pessoas e indirectamente, na limpeza da biomassa, rechega da mesma, trituração e transporte, de 150 a 200 pessoas. Existirão de momento em Portugal umas 11 centrais destas, o que totalizará 220 empregos directos e 2200 indirectos (arredondando para cima).
Por outro lado, existem presentemente 8 centrais de tratamento de resíduos sólidos, tendo este mês anunciado o Governo a instalação de mais 15 nos próximos anos. Admitindo 10 empregos directos por central (de estatísticas na Virginia, EUA, hyperlinkadas adiante), teremos presentemente aqui 80 empregos directos, a crescerem para uns 230 no futuro próximo. Os empregos indirectos, associados à recolha dos resíduos (a mais que na recolha usual), poderão generosamente extrapolar-se de cálculos americanos para uns 15 por central, o que totalizará cerca de 120 no presente e 450 a prazo.
Estamos, pois, em condições de somar tudo:
Empregos directos ----- Indirectos (melhor estimativa):
Biomassa 220 -------- 2200 (2420)
Lixo 80 -------- 120 ( 200)
Solar 350 -------- 400 ( 750)
Eólica 3200 -------- 4200 (7400)
Mini-hídricas 150 -------- -- ( 150)
Barragens 5400 --------- 3600 (9000)
Total: 9400 ------- 10320 (19720)
Chegamos, assim, a um valor final redondo e generoso de cerca de 20 mil empregos, dos quais perto de metade directos e metade indirectos.
Porém, estes números poderão crescer ocasionalmente durante os processos de instalação e construção de novas centrais termoeléctricas (biomassa e resíduos sólidos) e mini-hídricas mas, por outro lado, também descerão drasticamente uma vez terminadas as obras nas grandes barragens do Plano Nacional.
Quando isso suceder, e já contabilizando os 84 funcionários necessários para a O&M dessas barragens e o crescimento das centrais de resíduos sólidos, os empregos remanescentes, portanto os (razoavelmente) sustentáveis, serão de uns 4250 directos e 6950 indirectos, totalizando, redondamente, 11 mil empregos. Que também se poderão assumir como 10 mil empregos, considerando os múltiplos arredondamentos para cima feitos na estimativa...
Parece evidente não ser com isto que se poderá resolver o problema dos 800 mil desempregados que Portugal terá em breve...
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