sexta-feira, julho 24, 2009

Ainda o mistério do grande salto em frente da I&D das empresas: a PT Inovação

A PT Inovação, herdeira do glorioso "CET de Aveiro", uma das raríssimas entidades nacionais não-Universitárias que já fazia I&D há 30 anos, contribuiu com os seus 420 empregados para os 550 investigadores das estatísticas do Ministério da Tecnologia para o sector das Comunicações.

Em 2005, a PT Inovação teve um total de despesas de 53 M€, valor que subiu para 65 M€ em 2007. Ao mesmo tempo, nas estatísticas do Ministério da Tecnologia, a despesa em I&D empresarial nas Comunicações foi de apenas 14 M€ em 2005, mas subiu para 118 M€ em 2007.

Admitindo que 90% da despesa da PT Inovação em 2007 foi merecidamente contabilizada como sendo de I&D, então a PT Inovação terá sido responsável, sózinha, por praticamente metade da despesa total do sector em 2007.

Subsistem, porém, duas interrogações:

  • Em 2007, onde estavam os 150 investigadores restantes do sector de Comunicações, responsáveis pela outra metade da despesa de 118 M€? Ou há algum erro nas estatísticas oficiais?
  • Em 2005, tendo a PT Inovação tido 54 M€ de despesa, porque razão as estatísticas nacionais apenas contabilizaram 14 M€ para todo o país? Falta de incentivo à classificação contabilística das despesas de I&D como tais?
Uma coisa é evidente: a "reforma contabilística da I&D" legislada em 2005 foi certamente responsável pela contabilização da despesa da PT Inovação em 2007!
Esta "reforma", o SIFIDE, permite o abate à colecta fiscal de IRC de até 1/3 da despesa em I&D, incluindo imobilizado e despesas de funcionamento, com o limite de 0,75 M€ (em 2009 aumentado para 1,5 M€) e sem necessidade de apresentação de comprovativos de despesa - mas requerendo "certificação" prévia pelo Governo. Sem dúvida que o SIFIDE é responsável pelo grande salto em frente da despesa de I&D empresarial verificado em 2007, mas o "salto" terá sido essencialmente contabilístico.
Na verdade, o aumento de despesa em I&D da PT Inovação de 2005 para 2007 foi de 20%, uma evolução muito boa e que provavelmente reflecte o aumento real que terá ocorrido nas empresas em geral que fazem I&D, mas que infelizmente não se aplica à indústria de equipamentos, essencial pelos seus produtos transaccionáveis. Uma boa evolução, mas muito longe dos impossíveis 115% das estatísticas!
Entretanto, não tenho dúvidas de que:
  • A PT é de elogiar por ter sabido preservar e potenciar uma tradição rara em Portugal, a de ter um grupo de I&D que vem de antes do 25 de Abril e que não foi destruído, ao contrário do que aconteceu a outras estruturas, como o "laboratório central" das antecessoras da EDP;
  • É pena que as outras empresas participadas pelo Estado não sigam o exemplo da PT Inovação - EDP, REN, Metro, Refer, Galp, etc... Sendo empresas de bens não transaccionáveis, sem concorréncia, bem poderiam alavancar projectos de I&D para os seus fornecedores nacionais de equipamentos com potencial de exportação. Como na década de 80 ainda se fazia em alguns sectores, e depois se abandonou...

3 comentários:

Fernando Ribeiro disse...

Do Estado é também a EID, Empresa de Investigação e Desenvolvimento de Electrónica, que em tempos idos pertenceu à Centrel, o grupo empesarial de Rocha de Matos.

A EID continua a existir e dedica-se às telecomunicações militares, segundo refere o seu sítio na Internet: http://www.eid.pt/.

Eu próprio trabalhei fugazmente nela na década de 80. As comunicações militares já eram então uma componente forte da actividade da empresa, que tinha na Armada o seu cliente mais importante. Entre outras coisas, a EID equipou as fragatas Meko.

Anónimo disse...

Por este artigo é evidente o desinvestimento real em I&D apesar da "máscara" contabilística.

Por um lado desinveste-se nas poucas actividades de I&D que existem no país com o argumento de que: "não são rentáveis". Por outro lado, mascaram-se actividades quotidianas das empresas com actividades de I&D.

Se o I&D real, baseado na concepção de produtos ou melhoramento de processos, não é "rentável" deixo a seguinte dúvida: Qual é a rentabilidade das inúmeras apresentações de Powerpoint que inundam as empresas dos dias de hoje?

Desabafo: Por vezes tenho a sensação de que existem pessoas cuja actividade numa empresa se resume a fazer Powerpoints. Muitos deles nunca chegam a ser realizados (e os que chegam também não têm os resultados apregoados) e o próprio autor, passado algum, tempo já nem se lembra que o fez...

Anónimo disse...

Outra questão que pode evidentemente aumentar este "investimento" em I&D são os projectos de demonstração.

Há uns meses li num jornal sobre um "projecto" de demonstração de energia das ondas (penso que algures perto do Porto). A explicação presente no jornal apresentava uma estrutura pesada a nível de construção civil além dos geradores de energia das ondas. Ou seja, para este projecto ser concretizado existiu muito dispêndio de dinheiro a nível de tecnologias já testadas e com muito pouco I&D. Pelo que também li os geradores de ondas eram de concepção inglesa (ou escocesa) pelo que a incorporação nacional na parte efectiva de I&D seria zero.

Se forem gastos uns milhões de euros em projectos de "demonstração" (de tecnologia alheia) desta dimensão vamos ter uma aumento estrondoso a nível contabilístico.

Ou seja, o dinheiro do nosso "I&D" ainda serve para fazer a demonstração de tecnologia estrangeira (essa sim efectivamente de "I&D"). Gastamos o nosso dinheiro para vender os produtos dos outros.