sexta-feira, julho 03, 2009

Portugal, uma "Albânia, farol do ecologismo"?

A "aposta nas energias renováveis", na verdade a aposta na energia eólica, foi decidida pelo Professor Oliveira Fernandes, quando era Secretário de Estado do Governo de António Guterres.
Os Governos de Durão Barroso e Santana Lopes deram-lhe um grande impulso e, finalmente, o de Sócrates fez dela um dos esplendores da sua governação.
Entretanto, um ex-Secretário de Estado e um ex-Director-Geral da Energia, que foram decisivos neste grande projecto, vieram a obter sociedade numa das empresas mais beneficiadas com o grande negócio das eólicas e conhecida como uma das "empresas do regime", a Martifer.
Portugal é, presentemente, o 3º país da Europa com maior percentagem de energia eléctrica proveniente do vento, depois da Dinamarca e ombreando com a Espanha, e o 10º produtor mundial em capacidade instalada. Tal facto tem sido apontado com orgulho e chega-se a justificá-lo por combater a "dependência energética".
Mas terá Portugal um especial interesse nesta posição de vanguarda, tendo em conta que a energia eléctrica de origem eólica custa, descontando taxas e subsídios, cerca do dobro da proveniente do carvão queimado nas grandes centrais de Sines e Abrantes?
Se analisarmos os outros países que ombreiam com Portugal na vanguarda da energia eólica, verificamos o seguinte:
- Na Alemanha, que é o maior produtor europeu e apontado como o país que mais fez para cumprir o protocolo de Kioto de 1997, existe uma poderosa e tecnologicamente liderante indústria de turbinas eólicas. Entre os seus vários fabricantes, destaca-se a avançada Enercon, de que a imprensa alemã deu conta de ter sido vítima de um roubo de tecnologia pelo Echelon americano em meados dos anos 90; por causa disso, as patentes da Enercon foram registadas primeiro pelos EUA, e esta está proibida de exportar para aquele país;
- A Dinamarca, que é a campeã mundial na percentagem do consumo eléctrico de origem eólica, tem o maior fabricante mundial de turbinas, a Vestas, responsável por exportações no valor de 4 mil milhões de euros anuais.
- A Espanha, nossa companheira, tem também vários fabricantes de turbinas, e entre eles a Gamesa. A Gamesa exporta metade da sua produção, em especial para os EUA e a China (que entretanto instala uma central a carvão nova por mês!...).
- A Vestas, a Enercon e a Gamesa detêm, respectivamente, o 1º, o 3º e o 4º lugar no ranking dos fabricantes mundiais de turbinas eólicas. O 2º lugar é da GE americana.
- Segundo dados da EWEA, a Associação Europeia da Energia Eólica, no final de 2007 a energia eólica dava emprego directo ou indirecto a 154 mil pessoas na Europa. Destas, cerca de 100 mil eram na Alemanha, Dinamarca e Espanha, com 38 mil no país "hermano". Segundo o mesmo relatório da EWEA, o número de empregos efectivamente já criados pela indústria eólica em Portugal, nos finais de 2007, era de... 800!
Estes números evidenciam o facto de, sendo Portugal um "líder" do eólico, o ser mas só enquanto consumidor! E, se é facto que este Governo procurou trazer para Portugal alguma fabricação de componentes (a EWEA reconhece a criação em 2009 de mais 3 mil empregos), também é verdade que não temos qualquer domínio da respectiva tecnologia nem, pois, qualquer poder de decisão na sua fabricação e, portanto, ela é tão sustentável como a da Quimonda ou a das fábricas de montagem de automóveis!
Mas será que Portugal tem especiais condições de vento, que tornem particularmente interessante essa fonte de energia?

Ora os mapas de ventos mundiais recentemente publicados por um estudo feito em Harvard com dados da NASA, e os estudos da EWEA, mostram que nem por isso. O vento é muito variável, e uma turbina eólica passa a maior parte do tempo a produzir nada ou muito pouco
(e é essencialmente por isso que é difícil rentabilizar as turbinas). Em zonas de bom vento, uma turbina conseguirá gerar, em média, 1/3 do que seria capaz se soprasse sempre o vento ideal; mas em Portugal, como na maioria dos países europeus, as turbinas só geram, em média, 1/5 a 1/4 da sua capacidade. Aliás, abaixo de 1/5 considera-se que não há vento que justifique o investimento, mesmo com generosos subsídios. E 1/4 é precisamente a média que produzem as turbinas em Portugal, mas as próximas já serão em locais cada vez piores...
Na Europa, os melhores ventos estão nas costas do mar do Norte e do Báltico, na costa da Escócia e na da Irlanda, e em Navarra (no mapa ao lado, a qualidade do vento decresce do máximo em roxo para o mínimo em verde). E essa é a outra razão porque alguns países dessas regiões tanto investiram na energia eólica, como precisamente a Dinamarca, a Alemanha e a Espanha.

Portugal, portanto, nem tem particularmente boas condições de vento, nem uma indústria exportadora e empregadora de turbinas eólicas, ao contrário dos outros países que "competem pela liderança" connosco nesta matéria. Qual é, então, a razão desta grande aposta portuguesa?
Numa entrevista à SIC de ontem o ex-Ministro da Economia foi claro: uma razão é o orgulho em sermos apontados como exemplo no combate às alterações climáticas, e outra o sermos um "laboratório" destas coisas.

Gostaria, porém, de lhe ter ouvido esclarecer que, sendo a energia de origem eólica mais cara que a tradicional, tal não é sentido pelos consumidores porque o referido custo extra tem sido remetido para o défice!
Porque será que isto me lembra a Albânia de Enver Hodja quando ela, na sua miséria e com a insignificância dos seus 2 milhões de habitantes, se considerava o "único país verdadeiramente revolucionário no mundo", o "farol do socialismo" mundial?

2 comentários:

Anónimo disse...

O problema de Portugal é que nunca fez um estudo sobre a redução de emissões de CO2 (que me parece ser de longe o maior problema ambiental enfrentado pela Humanidade). Aposta-se numa política de construção geração eólica (e como disse, e correctamente, o autor do blog de origem estrangeira - sem benefícios industriais para Portugal) desenfreada e que nunca vai conseguir suplantar as necessidades de energia eléctrica de Portugal (não há potencial para isso).

Na minha opinião deviam-se analisar todas as formas de geração de energia eléctrica (incluindo a nuclear) e de uma forma serena e factual estabelecer uma estratégia de médio/longo prazo para reduzir (se possível eliminar) as emissões de CO2 sem que os preços da energia em Portugal seja substancialmente superior aos dos restantes países.

De outro modo Portugal vai encontrar-se numa situação de excesso de energia eólica. E vamos assistir à desligação da energia eólica em detrimento da geração convencional (o vento não é tão fiável como o carvão, o gás ou a água por isso já há casos em que a produção eólica é desligada em favor da geração convencional).

Será que a estratégia actual é a melhor forma de evitar as emissões de CO2?

Como ficarão os preços da energia eléctrica daqui a 10/20 anos com o défice tarifário (neste momento o défice tarifário é de 2.000.000.000 de euros, segundo o presidente da ERSE em entrevista ao Expresso, o que daria actualmente cerca de 333 euros por consumidor - em apenas 2 anos de acumulação de défice tarifário)?

Anónimo disse...

2 mil milhões de € de défice?Segundo a entrevista aqui citada, no final de 2008 já era de... 8 mil milhões!!!
http://economico.sapo.pt/noticias/defice-tarifario-nao-e-bomba-relogio_13640.html