sábado, julho 25, 2009

A nova grandiosa ideia para a indústria nacional, a carroça eléctrica e o provável futuro

Julgo que este blog foi a primeira voz por cá em que alguém chamou a atenção para o problema das baterias, tentando meter alguma racionalidade na euforia pré-eleitoral que por aí anda quanto ao automóvel eléctrico.

Provavelmente graças a isso, ontem, na SIC-Notícias, um jornalista animou uma mesa-redonda sobre o automóvel eléctrico em que, entre as defesas de variados interesses, emergiu uma ideia por parte de um importante fabricante de baterias nacional, presentemente a atravessar sérias dificuldades, e que o mesmo jornalista retomou no Expresso de hoje: a de que, dado o mercado nacional de automóveis estar saturado e considerando a improvável retoma deste mercado nos próximos anos devido à Crise, o futuro do automóvel eléctrico passaria entre nós pela reconversão dos automóveis existentes (com o subsídio do erário público, claro).

Um Professor do Politécnico de Viseu que orienta 4 alunos que estão a desenvolver um "Veiculo Eléctrico puro" como trabalho da disciplina de Projecto e que estava ali como especialista, explicava: um carro eléctrico tem uma carroçaria, uma "energy storage" e um "powertrain", pelo que é só substituir os últimos, sendo certo que, segundo ele, o "powertrain" eléctrico é muito mais simples e robusto que o de combustão actual, visto ter só uma peça a rodar (o rotor), enquanto o motor de combustão tem centenas.

Este tipo de invenção da pólvora em directo na TV deixa-me siderado. Não haverá em Portugal quem saiba um pouco mais da tecnologia dos automóveis para ir à TV?
Bem sei que, como nunca os projectámos, tal até poderá parecer fácil, mas já ninguém se lembra do UMM, o jipe português projectado pelo francês Cournil em 1977, com motor Peugeot, robusto mas sem nenhuma das comodidades modernas, de que se fabricaram 1500 unidades até ao fim da sua produção há 15 anos? Constava que nos assaltos no deserto que ocorriam às caravanas turísticas, no Sahara, os salteadores levavam todos os jipes menos... os UMM, para que as vítimas pudessem regressar a casa!
A indústria automóvel é terrivelmente competitiva e há quem já lá ande há mais de um século e tenha dificuldade em se manter! Nas últimas décadas, poucos foram os países onde nasceram indústrias automóveis capazes de virem desafiar o domínio do mercado mundial pelos "grandes", e esses países têm todos em comum algo que falta completamente a Portugal: boa formação da população em Matemática, a alma da engenharia! Refiro-me, claro, ao Japão e à Coreia do Sul - a que se soma agora a China, razão porque os EUA é com ela que estão a desenvolver uma parceria para os seus futuros automóveis eléctricos! Na Honda, por exemplo, nenhum operário tem menos que o equivalente ao nosso 12º ano!...

A indústria automóvel tem mais de um século de experiência e inovações constantes. Pelo menos desde que as exigências de segurança automóvel começaram a ser impostas por Organismos internacionais e que, simultaneamente, o projecto automóvel passou a ser feito por computador (por "Computer Aided Design"), que o projecto da carroçaria, do chassis e do automóvel no seu conjunto é totalmente integrado, incluindo a escolha dos materiais e visando a máxima qualidade para o comprador ao menor custo de produção (havendo fabricantes que apostam mais na qualidade e outros que apostam mais nos custos baixos).

As necessidades de segurança e conforto exigem, por exemplo, que o centro de gravidade do automóvel seja baixo, que a repartição de pesos seja o mais equitativa possível entre eixos - qualidade, por exemplo, crítica para a estabilidade e segurança, e que justifica a opção pela tracção traseira por parte dos fabricantes que privilegiam a qualidade, opção mais cara que a habitual tracção à frente.
A boa repartição de pesos combinada com a rigidez torsional e a indeformabilidade do habitáculo explicam por que, por exemplo, certas zonas da carroçaria de um carro moderno podem ser em alumínio duro enquanto outras têm de o ser em aço. Por outro lado, a espessura e natureza do aço do chassis e da carroçaria são um compromisso entre o peso mínimo e a rigidez, sobretudo do ponto de vista da segurança, tendo em conta a massa total do veículo e a sua distribuição e centro de gravidade.
As marcas de qualidade têm na carroçaria previstas zonas de clivagem que permitem ao automóvel, em caso de colisão, a deformação programada do chassis e da carroçaria de modo a absorverem a energia da colisão protegendo o habitáculo, algo cuja patente data já dos anos 50.
Por outro lado, o chassis e toda a geometria do veículo, assim como o sistema de travões, de molas e de amortecedores, são projectados prevendo a potência que o motor poderá ter e os concomitantes esforços a que toda a estrutura será sujeita. Um BMW de série 5, por exemplo, com um peso médio de 1500 kg, tem motores cuja potência pode variar de 170 a 300 CV, mas um Honda Jazz, que tem metade do peso (e do consumo), só admite motores com potências até 120 CV. Obviamente que todo o conjunto tem de ser pensado simultaneamente!

Ora pensar em que se pode pegar num carro qualquer dos actuais, tirar-lhe o motor e o depósito de gasolina, substituir este por uma bateria de 300 kg e o motor por um eléctrico e manter tudo o resto como estava, lembra os primeiros automóveis no século XIX, que eram basicamente carroças com um motor a substituir os cavalos (na figura: Mercedes-Benz de 1894). Mas naquele tempo, em que as pessoas estavam de facto habituadas a carroças, ao menos estas novas poupavam o incómodo dos cavalos!


O futuro automóvel eléctrico terá de ter muito mais que o automóvel actual para poder conquistar os mercados, e poderá tê-lo, porque ele não vai estabilizar-se tão cedo e porque, entretanto, há muitas outras tecnologias em revolução que irão convergir com ele. Vou, por isso, tentar um pequeno exercício de imaginação integrada sobre o futuro automóvel eléctrico, o que existirá vulgarmente nas estradas, digamos daqui a 15 anos.

Em 2025, tendo estabilizado a tecnologia de baterias de iões de lítio (ou de super-condensadores baseados em nanotecnologias?) que armazenam a respectiva energia, o automóvel eléctrico desloca-se silenciosamente pelas estradas e ruas, em piloto automático e a velocidade praticamente constante. Os novos sistemas de GPS (na Europa, o Galileu) com resolução de 1/2 metro, e os sensores de presença de obstáculos, estão em comunicação pela rede celular com o grande sistema de gestão integrada de tráfego (o futuro Gertrudes) através da rede de microcontroladores que gerem o automóvel. Este sistema, "o Computador", conduz o carro automaticamente, de forma optimizada não só em função do destino indicado pelo condutor como em função do tráfego e do estado das vias. As suas baterias são carregadas à noite na garagem da vivenda onde mora o seu proprietário e, como não precisa de ser conduzido, o seu interior tem tantas semelhanças com o dos automóveis actuais como o destes tem com o das antigas carruagens; na verdade, os bancos destes automóveis passaram a estar colocados como os dessas antigas carruagens, banco contra banco, e entre os bancos existe uma mesa rectrátil onde se trabalha, joga às cartas, se toma uma refeição, ouse vê vídeo num plasma de alta definição (na figura: pequeno automóvel urbano do futuro...). :-)Claro, isto provavelmente acontecerá na América e nos países em que as pessoas morem em vivendas. Por cá, se não melhorarmos os nossos resultados escolares em Matemática, já não será mau se andarmos de trolleybus!

Mas claro que haverá sempre quem possa pagar o alto preço da gasolina, nesse futuro em que haverá de novo muita por pouca gente a poder pagar.

2 comentários:

Anónimo disse...

Meu caro a forma como o assunto carro eléctrico é "vendido" é mais um sintoma da esquizofrenia que afecta o plano tecnológico desde o seu início!

Anónimo disse...

As pessoas comem á colherada o que aparece na televisão